AINDA MARIA
As palavras são, verdadeiramente, seres frágeis que se desfazem junto ao vento diante da primeira investida de algum antigo sentimento. Eu disse que não falaria mais de Maria. A luta foi árdua e durante algum bom tempo consegui vencer a tentação de relembrá-la nestas poucas linhas. Sofri; certamente que tenho sofrido com as lembranças, e, o que é pior, com a relutância em dizê-lo a você, caro leitor.
Ontem a vi. Estava bela, vestida de forma simples, sem qualquer maquiagem ou exageros que marcam as mulheres de nossos dias. Não estava acompanhada, nem parecia entristecida; contrariamente, sua beleza fazia irradiar-se por todos os cantos em que passava e o que se sentia era uma alegria incontida, o que se mostrava no seu sorriso e em sua pele descansada.
Maria não me viu, nem tive coragem de mostrar-me a ela. Estava eu entristecido, cheio de rugas, de rusgas; cansado da imensa tristeza que me tomara desde o momento em que ela saíra de minha vida. Minto, ela não havia saído; continuava em mim, nos meus sonhos, nas minhas recordações, no meu choro diário; minha doce e meiga Maria se fazia transparecer, duramente, nas tantas rugas que se criaram em meu rosto.
Tive vontade de ir ao seu encontro; dizer-lhe do meu amor, dos meus sentimentos, da tristeza que toma a minha alma; quisera eu atravessar a rua, ajoelhar-me aos seus pés e suplicar a sua volta, o retorno incomensurável do seu amor. Não pude, faltou-me coragem, sobrou-me o pouco orgulho que ainda me resta.
Vendo-a repleta de beleza e alegria, ajuntei os meus cacos, recolhi toda a tristeza que caía de mim, em forma de lágrimas, e parti. Ao longe, com o coração em sobressaltos, ainda podia sentir o seu cheiro e toda a alegria que o acompanhava e, enquanto eu andava, o sorriso de minha doce e meiga Maria penetrava os meus ouvidos fazendo com que as lágrimas regassem minhas tristes rusgas.
Coração de Jesus, 27/08/2010
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