CAPÍTULO III
Os pássaros amontoaram-se no
sete-copas de frente a casa. Eles não cantavam, apenas observavam, quase que
solenes, o que se passava naquele lugar. A janela já estava aberta, na
tentativa de que o ar fresco daquela manhã penetrasse no ambiente. Nenhuma
daquelas aves ousava entrar, apenas olhavam compenetradas, entristecidas. Eram
papa-capins, sabiás, curiós, pintassilgos, trinca-ferros e canários-da-terra. É
bem verdade que eles sempre estiveram por ali, mas, antes, chegavam em
algazarra, entravam casa adentro e tomavam o restinho de café que o velho
deixava na velha xícara de porcelana, já encardida pelo líquido e pelo tempo.
A casa era simples e não
tinha muros. Uma grande cerca de arame farpado era a única barreira que a
separava da esburacada rua de terra. O pé de sete-copas ficava do lado de
dentro da cerca, tendo embaixo um pequeno banco de madeira, onde os namorados
transavam de madrugada, depois que a meninada brincava de pique - esconde e os
mais velhos conversavam amenidades.
As duas janelas passavam
todo o dia abertas, a não ser nos meses de agosto, quando Catarina tinha que
correr a todo instante para fechá-las contra algum redemoinho, enquanto a
molecada ficava assoviando no meio da rua, só para ver o saci fazendo
travessuras. Ambas eram azuis, de um azulado envelhecido, há muito pintadas por
Juca, pouco antes de trazer a menina para a sua casa.
As paredes, caiadas de
branco e tomadas pela poeira, fazia tempos já estavam amarelecidas, precisando
de uma nova pintura, sempre prometida pelo velho. E, aqui e acolá, ainda se
podiam ver as marcas das bolas de leite de mangaba que os meninos jogavam,
enquanto Juca estava em alguma roça, trabalhando para algum fazendeiro.
Ninguém sabia ao certo de
onde Juca viera. Fazia tempos que morava naquela pequenina casa; primeiro
sozinho, depois com Catarina, que alguns suspeitavam ser sua amásia,
recriminando-os pelo ato, já que, quando da sua chegada, ainda era ela uma
menina. Outros afirmavam ser Catarina uma filha do velho, recuperada tempos
depois de ser deixada em cuidados de alguma senhora, porque teria Juca matado a
companheira num átimo de ódio enciumado. Ainda havia aqueles que diziam que a
mocinha era apenas uma criança órfã, que Juca encontrara pelas bandas de
Bocaiuva num dia de muita chuva, debaixo de um enorme pequizeiro, enquanto
descia da Bahia, de onde teria vindo fugido de um velho coronel, cuja filha
tinha sido desvirginada pelo vaqueiro, estando este, há muito, jurado de morte.
Ninguém sabia ao certo de
onde Juca viera e nem mesmo qual a sua relação com Catarina, embora ela sempre
dissesse que o considerava como se deve considerar a um pai. Também não sabiam
as pessoas do Pitinha que naquela manhã Juca estava morrendo, nos braços da
mocinha, enquanto os pássaros observavam-nos de cima do Sete-copas, respeitando
aquele momento triste e derradeiro.