sábado, 22 de maio de 2010

A MULHER E O DESEJO


A MULHER E O DESEJO 1


Três horas da manhã. O telefone emudecido e o tempo sem querer passar. Quem sabe sair, tomar um chope em algum boteco, passear pelas ruas vazias da cidade... Não. Não tinha vontade alguma. Deitada na cama de casal, ela revirava a cada instante em busca de um corpo quente para se aquecer, em busca de um peito cabeludo com o qual pudesse disputar um espaço naquela imensidão inescusável de solidão.
Tentava ao menos uma feliz recordação. Uma lembrança de algum corpo perdido que encontrara sobre o seu corpo nu, num tempo distante em que nem mesmo conseguia se lembrar direito. Nada. Apenas a solidão estava ao seu lado, às três horas de uma manhã fria, numa cidade grande, onde tantas coisas aconteciam, menos consigo mesma.
Virava de um lado para outro. Sentia suores, o corpo tremia, talvez não sentisse frio ou mesmo calor, mas, de fato, sentia coisas estranhas acontecerem no seu corpo. Tinha vontade de viver, de morrer; tinha vontade de sair e, ao mesmo tempo (estranho!), tinha vontade de ficar quietinha no seu canto.
Na verdade, o que ela queria mesmo era um homem. Que fosse um homem cabeludo, másculo, que a possuísse e a fizesse sentir-se mulher. Tinha mais de trinta anos e fazia muito tempo que não sentia um outro corpo junto ao seu. Pensou algumas coisas absurdas, teve vergonha, quem sabe nojo, daquilo que pensara; contorcera-se na cama, começou a rezar, como se tivesse cometido um grande pecado.
Era uma mulher direita que morava sozinha. Trabalhava todos os dias num bom serviço: ganhava bem, tinha uma vida tranqüila, mas fazia tempos que não era possuída por um homem. Quase quatro horas da manhã e ela ainda não conseguira adormecer. Lá fora uma gata miava forte, talvez pedisse socorro para os deuses dos gatos.

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