sexta-feira, 29 de julho de 2011

DIÁRIO DE BORDO (2º Capítulo)

Os carros passam em alta velocidade pelas ruas largas de Brasília. As pessoas todas apressadas, nenhum bom-dia, ou mesmo um aceno com a cabeça. Todo mundo correndo, como se já estivessem atrasados. As lembranças de Beatriz e Teresa são quase arrasadoras, mas suporto, tenho que suportar.

            Tenho já um lugar para ficar, uma pensãozinha vagabunda, onde pago pouco e durmo muito mal. Faz uma semana que estou por aqui e ainda não fiz qualquer tipo de amizade. A dona da pensão é uma mulher gorda, pelo que ouvi dizer, é viúva, deve estar pelos quarenta e poucos anos, mas o seu jeito de vestir e seus movimentos bastante lentos lhe dão as aparências de uma senhora com bem mais idade. Ela conversa pouco, tem a cara fechada e quase nenhuma educação, mas, apesar de tudo isso, tem os quartos sempre cheios. Talvez por isso não sinta a necessidade de agradar este ou aquele inquilino. Não faz menção dos que freqüentam os seus dormitórios, daí poder-se encontrar todo tipo de pessoas e das mais diversas índoles, gente vinda dos mais recônditos recantos.

            Das tantas pessoas que passavam pela sala da pensão – além dos quartos, ali há uma sala grande com dois sofás velhos e uma televisão; uma cozinha onde deveríamos almoçar, mas apenas alguns aparecem; e um banheiro muito pequeno pelo qual temos que pelejar logo pela manhã – apenas alguns me chamam a atenção: um rapaz alto que sai sempre que o sol se põe e só volta quando o dia já vai corrido, alguns dizem que ele é gótico e outros que trata-se de um cafetão no Plano Piloto. Não acredito em nenhuma das hipóteses, creio ser apenas um notívago acostumado a perambular pelas noites do DF; uma mocinha bastante nova que sempre aparece com um sujeito diferente, entra pela sala e nem olha para os presentes, talvez com vergonha de sua vida, todos dizem ser aquela uma garota-de-programa; um homem de meia idade que sempre sai de manhã com sua maleta a tiracolo e volta tarde da noite, já bastante embriagado – dizem que ele era um grande empresário que faliu, mas que ainda cultiva os velhos hábitos.

            Existe ainda outra mulher. Talvez tenha uns vinte e poucos anos, loura de olhos cor de folha seca; não sendo alta, também não é pequena e, segundo me disseram, viera de Curitiba, não se sabe bem o porquê e nem como fora parar naquela pensãozinha vagabunda.

            Não sei por que aquelas pessoas são as únicas a me chamar a atenção, existem outras muitas naquele lugar, mas nenhuma tão singular quanto aquelas. Ainda não me acostumei com a capital, mas tenho a ciência da necessidade de estar por aqui; por isso tento me ambientar e, muitas vezes, se tenho vontade de chorar, por saudade das duas, me seguro e invento uns pensamentos estranhos, coisas capazes de me entreter. Tenho comprado quebra-cabeças, revistas e outros divertimentos, mas o meu divertimento é assentar-me no sofá e observar aqueles estranhos moradores da pensão. Não se trata realmente de um divertimento, aquilo nada mais é do que uma maneira que encontro para disfarçar as saudades que me ficaram para trás, mas ainda me doem forte no peito. Aquelas pessoas, cada uma com suas particularidades, cada qual com suas histórias, eram uma fonte de passatempo e estudo da sociedade e suas ações.

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