sexta-feira, 22 de julho de 2011

DIÁRIO DE BORDO (3º Fragmento)


Ainda me lembro de quando a conheci. Era uma mocinha tonta, de olhos azuis e cabelos bastante lisos e negros. Não gostava de ler, nem de cinema, muito menos ouvia músicas inteligentes. Talvez por isso eu tenha gostado tanto dela.
Agora dorme. Talvez sonhando com os nossos momentos. Ou, talvez sonhe com outros momentos, que não os nossos. Não sei. Definitivamente, sou péssimo para ler a mentes dos outros. Reconheço os pensamentos pela voz, mas não os leio; sou, por isso, um semi-analfabeto.
Faz tempo que estamos juntos, mas não sei se a conheço. Talvez eu não conheça nem a mim mesmo. Às vezes sou poeta, noutras sou roqueiro, blogueiro, apaixonado; e, às vezes, nem sou; deixo que sejam por mim. Aquieto-me em meu lugar e deixo estar. Melhor assim.
Fico por longo tempo a olhá-la. Teresa é bonita. Não uma beleza arrebatadora, mas uma singular, quase irreconhecível, mas que me chamou a atenção. Acho realmente que os opostos se atraem. Por isso ainda estamos unidos; embora talvez não por muito tempo. As lembranças do noticiário teimam em perpetuar-se em minha mente; a senhora presidenta e a sua fala intrigante, esta noite estranha... Tudo m e parece estranho; tudo me tem um terrível ar de despedida.
Deito-me. Mas, antes, observo Beatriz em sua cama. Ela dorme; Teresa dorme; o mundo dorme lá fora. Não sabem do que estar por acontecer, somente a presidenta e eu sabemos. Não consigo fechar os olhos e, por isso, fico olhando para o teto. Uma aranha caminha pelo telhado; de cabeça para baixo, parecendo tentar uma nova visão do mundo.
Um cachorro ladra. Deve ser algum bêbado cambaleando pela rua, voltando atrasado. Os outros cachorros completam o coro e uma música desritmada se constrói em meio à escuridão noturna. Será o que pensam os cães, os animais; será o que pensamos todos nós? As perguntas surgem em minha mente; tento controlá-las. Inútil. Elas tomam conta de mim, enquanto uma angústia profunda me pesa no peito.
Procuro organizar minhas idéias, enquanto observo a aranha quase alcançado o seu ponto final. Levanto-me, pego o chinelo e dou um fim ao inseto (Será que a aranha é mesmo um inseto?). As idéias se organizam, embora algumas ainda se debatam dentro de mim. Está tudo certo: amanhã, quando já fizer escuro, hei de partir. Nem Teresa ou Beatriz saberão. Irei sozinho. Não sei pra onde, por que e nem como; sei apenas que devo ir para qualquer ponto de chegada, assim como aquela aranha.
É tarde. O bêbado deita-se numa calçada qualquer. Os cachorros ladram quase em silêncio. Imagino toda a cena, enquanto um, mais curioso, chega-se junto do homem, lambe-lhe o rosto frio e sujo de terra (Resultado de alguma queda no caminho) e deita-se ao seu lado. Fecho os olhos e tento adormecer.

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