quarta-feira, 31 de agosto de 2011

PRIMEIRA POESIA EM BRASÍLIA


PRIMEIRA POESIA EM BRASÍLIA



A poesia me vem em forma de nuvem
Numa quente tarde Agustina
Em que Lenine canta versos tristes
E uma escura névoa toma-me o peito.
É uma poesia acinzentada
Áspera e lúcida
Concretamente construída
Sob os olhares atentos de Juscelino
Escrita em retilínea, sem curvas
Sem paixões sem gotas ilusórias.
Como que executivamente elaborada
Joga-se na folha virtual
E constrói-se pioneiramente
Com a frivolidade que lhe é própria
E a dureza que me vem à mente.

Termina-se a si mesma de súbito
E adentra-me a alma
Como que em busca de inspiração
E eis que jogo-lhe um pouco de alma
E um tanto de minha dor
Fazendo-se, assim, a poesia
Primeira de meu ardor.


Elismar Santos, 31/08/2011

terça-feira, 30 de agosto de 2011

POLÍTICA


POLÍTICA

Irrelevantes contradições
Incessantes contravenções
Eternas         contradições.

domingo, 28 de agosto de 2011

MEDO E ESPERANÇA


MEDO E ESPERANÇA

A uma de suas Crônicas, no livro "Escritos na água", Alcione Araújo intitula "Medo e Esperança". Ainda não a li, mas apenas pelo título já me vejo interessado. Às vezes nos encontramos predispostos a nos identificar facilmente com palavras que nos levem ao fundo da alma; assim como no referido título. Talvez  isso aconteça por sermos demasiadamente sinceros ou, ainda, por estarmos em uma situação em que somente a esperança e o medo sejam capazes de nos manter em linha reta.
Drummond é um dos poetas sempre prontos a apregoarem a importância de se cultivar a esperança, embora em muitas e diversas situações, facilmente, seja capaz demonstrar o medo que sente. Fernando Sabino se apresenta como outro esperançoso, apesar de deixar transparecer os medos que muito pouco lhe faz presença. De certa forma, nunca seríamos capazes de carregar em nossas palavras, quiçá em nossa alma, apenas um destes inseparáveis sentimentos, simplesmente pelo fato de sê-los, imponderavelmente, inseparáveis.
Separamos o joio do trigo; o óleo da água; mas, indistintamente, talvez nunca haveremos de separar o medo da esperança. Temos, sim, o medo de arriscar, de correr atrás, de criar novas situações, mas cultivamos a eterna esperança de que um dia, ainda que próximo ou longínquo, tudo possa dar certo. E essa esperança, dosada pelo receio de  ilusão, que nos faz seguir em frente e tentar, ainda que com cautela e canja de galinha.
Na rua, enquanto o sol se põe e a lua dá o ar de sua graça, alguns moleques brincam de bola. Certamente, existe naquela brincadeira a esperança de que um gol venha a ser a salvação da lavoura, no entanto, no peito arfante de cada um crepita o receio de uma falha do goleiro, ou uma bola respingada na área, ponha tudo a perder. Por isso, enquanto escrevo estas, a partida se arrasta em zero, mas sem tempo determinado para chegar ao seu final.

sábado, 27 de agosto de 2011

VULTOS AGOSTINOS


VULTOS AGOSTINOS





Zé jogado na rede pensava na vida e nas coisas que vivera.
Pobre Zé em sua rede e seus pensamentos,
Revirando os arquivos da vida que passara
O que via eram apenas chuva e sofrimento

O resto eram apenas raios de sol
Numa manhã pintada à mão.

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

COISAS DA VIDA


COISAS DA VIDA


Estava atrasado, mas não tinha pressa.  Por isso, caminhava lentamente; pensando besteiras, sonhando loucuras acordado. Recostou-se à parede esperando pelo ônibus e ficou a observar os passantes: uma moça de saia curta e blusa de frio, com os cabelos pouco abaixo dos ombros e pintados de vermelho, os olhos grandes e os lábios carnudos. Quem sabe poderia ser aquele o amor que nunca tivera!... Mais à frente, um senhor gordo, com um ar triste. Talvez mais um dos tantos desiludidos desta vida ingrata!... Um rapazinho com vários piercings e tatuagens pelo corpo; outro senhor, com um jornal debaixo do braço; uma velha a segurar-se por uma bengala... E o ônibus que parecia nunca chegar...
Meia-hora, um pouco mais, até o escritório; um trânsito caótico; um chefe exigente; uma vida sem atrativos. Esta era a sua rotina; sempre a mesma labuta e nenhuma diversão. Enquanto o ônibus se arrastava pelas ruas lotadas de carros e pessoas atrasadas, ele pensava na vida: quanto tempo não teria perdido até aquele instante, dentro de um ônibus, dentro de um escritório, escondido dentro de um paletó, sufocado por uma gravata e tantas ordens? Mas não teria forças para se libertar; resignar-se-ia àquela mesma rotina, sempre cumprindo ordens, recebendo no final de mês, passando todo o tempo com a corda no pescoço...
Pela janela do ônibus, observava as pessoas dentro dos carros. Cada uma com seus problemas, suas intempéries, seus enigmas a serem resolvidos. O que pensaria o sujeito que retirava melecas do nariz, fazia bolinhas e ficava a brincá-las por entre os dedos, feito fosse uma bolinha de papel? E o senhor que olhava distraidamente para frente, enquanto o trânsito não andava; será em que pensava aquele homem? E a mulher que se maquiava olhando-se no espelhinho retrovisor? Será que todos tinham problemas, será que eram infelizes como ele; ou tinham uma vida completa, cheia de felicidades e alegrias?...
O trânsito estagnara-se. Atrás do ônibus, carros buzinavam como se tivessem desesperados; motos cortavam o vácuo entre os carros como flechas à procura de um alvo a perfurarem; alguns motoristas desciam dos carros e punham-se a fumar seus cigarros, às vezes, conversando com os colegas de estagnação, reclamando dos sinais, dos barbeiros, dos governantes, dos times de futebol, das mulheres; mas ninguém reclamava da vida, somente ele o fazia, ainda que intimamente.
Não era nascido na Capital. Viera do interior, em épocas de “vacas magras” a fim de “construir” a sua vida e o máximo que encontrara fora aquele serviço. Trabalhava muito, ganhava quase nada, não ia às festas nem namorava. Ficava em casa, lia um livro, escutava música ou assistia televisão. Sua vida era mesmo um tédio. Não tinha parentes vivos; antes tinha uma mãe, o pai nem chegara a conhecer, não o quisera registrar. A mãe o abandonara quando ainda era criança, deixou-o sozinho em casa numa manhã ensolarada, disse que ia dar umas voltas e nunca mais voltou. Resolveu sair também e, desde então, perambulara muito pelo mundo.
Sonhava acordado, mas não tinha sonhos. Antes, apenas imaginava, reconstruía a sua vida como ela deveria ter sido: com uma mãe, um pai, um ou dois irmãos, esposa e filhos. Não os tinha; a única coisa que lhe restava era o trabalho e a vida. O primeiro não queria- pois merecia coisa melhor – e a vida, esta não lhe pertencia, sabia que era emprestada e, a qualquer momento, ela lhe poderia ser requisitada. Já havia sido um sujeito sonhador, crente na vida e esperançoso quanto ao futuro, seu e da nação; agora era cético, descrente de qualquer coisa.
Perdia a paciência com aquela espera. Certamente, seria reclamado e de nada lhe adiantaria desculpar-se. Pensou descer, ir a pé, atravessar a pista e pegar outro ônibus, um táxi talvez. Melhor seria se tivesse o seu próprio veículo, um carro, uma moto... Não. Haveria de estar ainda naquele trânsito; parado, sem nenhuma brecha para fugir. Melhor seria continuar ali, a espera que algum milagre acontecesse e a vida continuasse; mas nem mesmo nisso conseguia crer, pois milagres não acontecem...
O sol começava a alcançar-lhe o rosto. Deveria mudar-se daquela poltrona, mas todas as outras estavam ocupadas, cheias de pessoas cansadas, estressadas, desiludidas. Ao seu lado, uma senhora gorda cochilava, deixando o rosto pender ora para um lado, ora para outro. Era uma mulher gorda, mas, com certeza sem qualquer sinal de saúde e que talvez dormisse para sanar sua dor, quiçá a tristeza que a destruía sempre um pouco mais.
Pensou em levantar-se, correr do sol. Ficaria em pé no corredor e, se demorasse um pouco mais, desceria do ônibus e pegaria um outro carro. Alguém foi mais rápido; era um rapazinho de terno e gravata, com ares de impaciência. Levantara-se e fora embora, deixando o lugar para quem se dispusesse e, o melhor, ao lado ficara uma mocinha linda, com olhos azuis e cabelos enegrecidos.
Sentou-se rapidamente ao seu lado. Pretextou uma conversa, mas teve receios. Não tinha mais aquele hábito de adolescente conquistados – o qual nunca houvera sido -  ficara olhando pela janela, talvez a espera de que alguma expiração lhe viesse e pudesse dizê-la àquela menina. O ônibus começara a andar. Olhava pela janela e, outras vezes, olhava o rosto de sua vizinha. Era mesmo linda, com traços bem feitos, como que os versos de um belo poema construídos pelo poeta mais caprichoso. Era aquela a sua paixão, a que sempre esperara e nunca, ainda, havia encontrado. Criou-se de coragem e encheu o peito para falar-lhe; mas eis que o ônibus parou, ela levantou-se e desceu. Pensou ir atrás, mas não podia fazê-lo. Estava atrasado e o chefe ainda o haveria de reclamar. Deixou que sua paixão se fosse e nunca mais a encontraria novamente. Ela não era daquela cidade.