Faz dez dias que,diariamente, ando de Lotação. Sempre a mesma coisa: embarca num ponto, atravessa um monte de cidades, vê um bocado de acontecimentos, para num outro ponto, resolve o que deve ser resolvido e volta à rotina anterior.
No ônibus se ouve muita coisa: gente reclamando da vida, dos preços altos, do calorzão que faz em Agosto, do governo, da mulher, do colega de trabalho... enfim, reclama-se simplesmente pelo ato de fazê-lo. E nada disso me chama tanto a atenção como a cordinha de varal que fica suspensa no corredor do ônibus. Isso mesmo; aquela cordinha desbotada que todos os Lotações possuem para que possamos puxá-la e, assim, avisar ao "motor" de que queremos apear.
Creio que ninguém tenha ainda reparado. Mas como sofre aquela coitadinha! Sempre alí, no seu canto, quietinha; até que chega alguém e põe-se a puxá-la. Dói, deve doer ser puxada daquele jeito, meio sem jeito, aos travancões, sem qualquer tipo de carinho ou apreço. O mais doloroso, no entanto, é observar as mãos que tocam-na; umas mãos sujas, grossas, cheias de calos, desprovidas de qualquer calor humano. Sim, pois estas nã o tem. São desprovidas de vida, de amor, de calor humano.
Ainda hoje, pus-me a reparar um sujeito que puxava a pobrezinha. Fazia-no grosseiramente, sem carinho, sem dó ou piedade da cordinha. Pensei em levantar-me da minha poltrona e tomá-la de sua mão; acariciá-la e devolvê-la ao seu devido lugar. Não, não o fiz. Como sempre, coloquei-me a pensar e cheguei à absurda conclusão de que, assim como muitas mulheres que existem por aí, ela gosta. Com certeza gosta de ser maltratada, senão já teria se mudado.
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