quinta-feira, 18 de agosto de 2011

A MULHER PASSANTE

Ninguém sabia quem era, nem de onde viera. Ela chegara numa manhã qualquer, trazendo uma maleta e um grande sorriso nos lábios. Fazia sol e, da varanda onde nos encontrávamos, mal víamos aquela pessoa que apareceu lá no final da rua. O Arnaldo, tinhoso como só, disse que devia ser alguma cigana desgarrada que viera pousar naquele recanto. Não sei, não havia ainda formulado nenhuma ideia sobre a pessoa em si.
Era bonita em demasia. Tinha os olhos azulados e os cabelos de um ruivo vistoso, o que se acentuava ainda mais com o reflexo do sol sobre si. Trazia sobre a cabeça um chapeuzinho branco, o qual, costumeiramente, tirava para enxugar o suor que escorria pelo rosto. E era um rosto meigo, como há muito não se via por aquelas bandas. Cheguei à conclusão de se tratava de alguma moça da cidade grande. Talvez fosse apenas uma passante, ou, quem sabe, poderia ser mais uma daquelas tantas que migram para o interior em busca de um homem velho, rico e bonachão.
Vinha lentamente, como quem estivesse a carregar um grande peso nos braços. O Arnaldo fez menção de ir ao seu encontro, talvez para ajudá-la; apenas ergui uma das mãos e ele logo compreendeu que não devia fazê-lo. Meu coração corroía-se por dentro; pudesse, ia eu mesmo ajudá-la, pegar a sua bagagem e, se fosse o caso, pegá-la também nos braços e levá-la à minha humilíssima morada. Mas sou um homem casado e, ademais, não faço a menor ideia de quem fosse aquela bela mulher.
Andava quase desfilando, ainda que com a dificuldade da pesada maleta. Chegou-se junto à varanda e disse com uma voz tão angelical como uma sinfonia clássica:
- Bom dia. Venho de longe e estou muito cansada. Será que, por obséquio, poderia me dar um lugarzinho para descansar até que eu possa continuar minha caminhada?
De bom grado eu lhe daria um lugar para descansar, mas não acredito em pessoas que falam de modo tão difícil. Nunca ouvira falar em "Obséquio" e, além do mais, estou certo de que minha senhora não teria gostado de ver uma moça tão bem feita em sua morada. Por isso, levantei-me, entrei casa adentro e fechei a porta rispidamente.

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