AS
VIDAS DE UMA MENINA
Vinha segurando a mão do
pai, ora olhando para trás, ora para cima ou para os lados.
Vestia um vestidinho azul, com um grande laço rosa com um nó
atrás, junto à cintura; os cabelos eram loiros, quase
avermelhados e eram presos por um meigo lacinho da cor do que rodeava
o vestido; calçava uns sapatinhos brancos, daqueles que deixam
a parte superior do pé à mostra.
O pai parecia grande, bonito e
forte. A mãe ficara em casa, cuidando dos afazeres diários,
tomando conta do bebê, ouvindo o rádio ou assistindo à
televisão. O pai andava apressado, segurava forte a sua mão,
puxando-a com força, como se estivesse com pressa, apreensivo,
com medo de alguma coisa. Quis lhe pedir um sorvete, mas conteve-se.
Notava que ele estava nervoso, não queria afobá-lo
ainda mais.
Os prédios eram altos e lá
em cima havia pessoas. Pessoas ricas, bem sabia ela. A sua família
era pobre, às vezes nem comida tinham para o almoço e
muitas vezes dormiam sem nada para comer. O pai trabalhava, a mãe
ficava em casa. Um dia ele quisera vender a televisão, mas a
mãe não deixara; quisera desfazer-se do rádio,
mas ela não quisera. Ela sabia que eles brigavam muito.
Sentaram-se num banco numa
pracinha, bem de frente a uma igreja. O pai parecia cansado. Ela
sentou-se ao seu sua mão era lisa e segurava leve. No fundo
tinha certeza de que o filme se repetiria. lado. Via que o homem
estava triste; por isso o abraçou. Ele não retribuiu,
mas não a afastou. Sentiu que ele chorava e, então,
apertou ainda mais o seu corpinho junto ao dele. Tentou olhar nos
seus olhos, mas ele virou-se e soltou uma palavra feia.
A polícia veio. O pai não
correu. Levaram-no para longe e puseram-na numa casa estranha.
Perguntava pela mãe, pelo irmãozinho, pergunta pelo pai
e nenhuma resposta lhe era dada. Um dia vieram buscá-la.
Vestiu sua melhor roupa, a mesma daquele dia; amarrara os cabelos com
o mesmo lacinho e pusera-se assentada junto à porta da escola,
esperando pelo pai. Era um homem, mas não o pai. Este era
baixo, magro, com um olhar triste e um jeito de poeta. Não
disse nada, mas sentiu que sua mão era lisa e segurava leve.
No fundo tinha certeza de que o filme se repetiria.
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