terça-feira, 6 de março de 2012

AS VIDAS DE UMA MENINA



AS VIDAS DE UMA MENINA




Vinha segurando a mão do pai, ora olhando para trás, ora para cima ou para os lados. Vestia um vestidinho azul, com um grande laço rosa com um nó atrás, junto à cintura; os cabelos eram loiros, quase avermelhados e eram presos por um meigo lacinho da cor do que rodeava o vestido; calçava uns sapatinhos brancos, daqueles que deixam a parte superior do pé à mostra.
O pai parecia grande, bonito e forte. A mãe ficara em casa, cuidando dos afazeres diários, tomando conta do bebê, ouvindo o rádio ou assistindo à televisão. O pai andava apressado, segurava forte a sua mão, puxando-a com força, como se estivesse com pressa, apreensivo, com medo de alguma coisa. Quis lhe pedir um sorvete, mas conteve-se. Notava que ele estava nervoso, não queria afobá-lo ainda mais.
Os prédios eram altos e lá em cima havia pessoas. Pessoas ricas, bem sabia ela. A sua família era pobre, às vezes nem comida tinham para o almoço e muitas vezes dormiam sem nada para comer. O pai trabalhava, a mãe ficava em casa. Um dia ele quisera vender a televisão, mas a mãe não deixara; quisera desfazer-se do rádio, mas ela não quisera. Ela sabia que eles brigavam muito.
Sentaram-se num banco numa pracinha, bem de frente a uma igreja. O pai parecia cansado. Ela sentou-se ao seu sua mão era lisa e segurava leve. No fundo tinha certeza de que o filme se repetiria. lado. Via que o homem estava triste; por isso o abraçou. Ele não retribuiu, mas não a afastou. Sentiu que ele chorava e, então, apertou ainda mais o seu corpinho junto ao dele. Tentou olhar nos seus olhos, mas ele virou-se e soltou uma palavra feia.
A polícia veio. O pai não correu. Levaram-no para longe e puseram-na numa casa estranha. Perguntava pela mãe, pelo irmãozinho, pergunta pelo pai e nenhuma resposta lhe era dada. Um dia vieram buscá-la. Vestiu sua melhor roupa, a mesma daquele dia; amarrara os cabelos com o mesmo lacinho e pusera-se assentada junto à porta da escola, esperando pelo pai. Era um homem, mas não o pai. Este era baixo, magro, com um olhar triste e um jeito de poeta. Não disse nada, mas sentiu que sua mão era lisa e segurava leve. No fundo tinha certeza de que o filme se repetiria.

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