É verdade, todos nós somos
treinadores, jogadores e comentaristas de futebol; assim como também somos
médicos, psicólogos e professores. Apesar de tantas habilidades, muitas vezes
não fazemos nada direito e nenhuma dessas funções se transforma no nosso
ganha-pão.
Exemplo desta distorção humana
é o Andrelindo. Rapaz alto e vigoroso, que chegou há pouco do Ribeirinho. Todos
os dias manuseava a bomba de gasolina do único posto da cidade e, depois do
expediente, dava as suas pernadas na pelada do Pequi-preto.
Em campo, Lindo – chamávamo-lo
assim por pilhéria – jogava de zagueiro, lateral direito, lateral esquerdo ou
volante, mas, se o time precisasse, fazia as vezes de goleiro, pois acreditava
que a coletividade sempre devia prevalecer sobre o individualismo de cada
jogador. Mas, a verdade é que Andrelindo não passava de um grande perna-de-pau
e, para não perder a sua posição, aceitava que lhe escalassem em qualquer setor
dentro das quatro linhas.
Um dia, quando o técnico não
pode participar do jogo, por algum problema de saúde, Lindo, sempre solícito,
ofereceu-se para ser o nosso professor, e, de súbito, ainda indicou ao
moribundo uma garrafada que era tiro e queda no tratamento daquele problema. Assim,
começamos o jogo no 4-4-2, variamos ao 3-5-2 e pulamos, já no segundo tempo,
para o 4-1-4-1.
Faltavam quinze minutos para
o fim da partida, quando Lindo resolvera se escalar. Sacou o nosso centroavante
e pôs-se, de toalha e sabonete, no bico da grande área. E, como quem fosse
resolver o problema, gritou aos seus comandados:
- Joga a bola ni mim, que eu
se consagro. Vou virar esse jogo, cês vão ver!
Com o novo matador, o time
passou a atuar no 4-3-2-1. Perdíamos por um a zero, mas, é inegável que ganháramos
um ânimo novo. Os zagueiros se matavam em campo, os volantes batiam até na mãe,
enquanto os armadores corriam de um lado a outro, preparando a bola para
Andrelindo.
De repente, a bola fatal.
Era a chance do empate, o início de uma virada histórica. Um desgarrou pela
esquerda e correu como louco; chegou à linha de fundo e cruzou uma bola
perfeita para o meio da pequena área. Lindo não pulou, ficou olhando a bola,
que passou a um palmo da sua cabeça, bem de frente aos seus olhos. O zagueiro
adversário pegou a bola, lançou longamente ao atacante e eles marcaram os dois
a zero.
Debaixo do pequizeiro,
depois da partida, um mais exaltado reclamou:
- Poxa, Lindo, se você
pulasse era gol certo. Ficou parecendo um mindingo, sem força nem pra pular!
Andrelindo, pensativo,
respondeu sem sobressalto:
- O certo não é mindingo, é
mendigo! E ocê que nem jogano tava!
Lindo ainda jogou durante um
tempo e nunca mais foi ao ataque. Da última vez que o vi, quando fui a BH, ele perambulava
pelas ruas do centro, conversando sozinho, refazendo táticas e cornetando os
jogadores.
Obrigada!
ResponderExcluirBacana!
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