Os jornais do dia davam
a mesma notícia, todos versavam sobre a votação contra o presidente. Na
esquina, alguns homens, esquentando o sol da manhã, com toda a autoridade que o
Jornal Nacional lhes dera, filosofavam sobre a situação do país. Um, mais
exaltado, com o dedo em riste, falava que apenas o exército é quem resolveria o
problema da nação.
Algumas mulheres
tomavam café na porta da rua. Com um lenço encardido na cabeça, uma balançava a
cabeça para outra e dizia, ainda com a cara amarrotada, um “Bom dia, vizinha”.
A resposta vinha seguida por uma pergunta sobre a situação política e, logo,
passavam-se às amenidades, enquanto o frio da madrugada dava lugar ao tímido
sol matutino.
As varredeiras subiam a
rua arrastando as vassouras de um lado a outro, jogando a terra que descia lá
de cima para dentro dos buracos que formavam à beira do asfalto. Entre risos,
uma vaticinava que “Um dia, alguém ainda cai dentro duma cratera dessas”. As
outras riam olhando para o lado, para verem se o fiscal não estava chegando. Um
homem passava de bicicleta e, balançando a cabeça, dava um rápido “Opa!” e
seguia para o boteco. Precisava de um trago de pinga para começar o dia.
Algumas crianças
desciam para a escola. As pesadas mochilas pareciam dançar em suas costas,
enquanto elas conversavam sobre futebol, brincadeiras, namorados e vídeos do
Youtube. O sino da igreja batia as sete badaladas e elas já deveriam estar no
portão, ou dentro das salas de aula. Chegariam no segundo horário, não tinham
pressa, nem vontade de estudar.
Alheio a tudo isso,
Dingo descia, rapidamente a rua, com o sorriso estampado no rosto e toda a
alegria que os sonhos lhe permitiam. Não guardava rancores ou desilusões;
apenas parecia ter a certeza de que tudo não passava de mera poesia e,
esfregando rapidamente as mãos, repetia aos sisudos transeuntes:
- Bora pra roça, bora pra
roça, bora!
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