segunda-feira, 1 de outubro de 2018

UMA CRÔNICA DE SUCESSO


Da janela do apartamento, observava as pessoas que passavam lá embaixo, um amontoado de gente, parecia mais umas formiguinhas caminhando, desordenadas, de um lado para outro. Eram homens indo para o trabalho, mulheres levando os filhos para a escola, adolescentes correndo para pegar o ônibus, camelôs atrapalhando a passagem dos transeuntes. Todos os dias era a mesma coisa.

            O sino da igreja ainda não havia começado a trabalhar, pois ainda não deram as sete horas. Alguns mendigos já perambulavam pelas ruas, enquanto outros ainda dormiam debaixo da marquise do supermercado. As pessoas tinham medo dos mendigos e, por isso, poucos passavam por ali, atravessando a rua, no meio dos carros, para, depois, voltarem para o mesmo lado. Vez ou outra, um acidente acontecia.
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            Levantava-se às cinco, pontualmente, todos os dias. Preparava o café; assentava-se de frente a televisão e via as notícias dos jornais. Depois, às sete e trinta, saía para comprar os pães e o jornal do dia. Voltava para casa e plantava-se diante do computador. Era “encostado”, embora ainda não tivesse chegado aos quarenta. A pressão do dia-a-dia o fizera ser encostado. Os médicos falaram em “Estafa”, ou alguma coisa parecida.  

            Era àquela hora, enquanto a cidade amanhecia, que colhia as suas história. Havia virado cronista, por falta do que fazer. Punha-se à janela, escorado no parapeito e ficava a observar a multidão alvoroçada. Sempre acontecia algo de interessante, sempre surgia uma história para ser contada. Depois, lia os jornais que comprava na banca de seu Arnaud, e enchia-se de desesperança perante a sociedade. E seus textos eram lidos na internet, por um sem número de pessoas, que o consideravam um Escritor.
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            Dessa vez, contaria a história de uma mulher bonita, de longos cabelos encaracolados, ruivos, que vestia um vestido florido, de alcinhas, cujo seios ele conseguia visualizar de onde se encontrava, e eram durinhos, embora ela não mais fosse um mocinha. Talvez já fosse uma balzaquiana; talvez vivesse no subúrbio; talvez trabalhasse nalgum dos bordeis das ruas debaixo; talvez nem fosse tão bonita assim.

            Ela seguia rapidamente o seu caminho, os cabelos balançando de um lado para outro, o vestido bailando ritmicamente, sendo jogado de um lado para outro com as trombadas dos transeuntes. A mulher dançava por entre as tantas pernas que passavam, negando de todos, quase correndo. Talvez tivesse pressa de chegar; quiçá, fugia de alguém que a perseguisse. Mas não se via ninguém à sua cola, nenhum homem ou mulher.
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            De repente, um grito! Ela saiu em disparada e jogou-se de encontro aos carros, que vinham em alta velocidade, no cruzamento da rua com a avenida, lá embaixo, próximo à loja de eletrodomésticos. O trânsito ficou embaraçado. Os motoristas xingavam palavrões, pois chegariam atrasados ao trabalho. Um guarda chegou correndo; conferiu o pulso; fechou-lhe os olhos e mandou, pelo rádio, um recado à central: “Que viessem os peritos e a funerária.”.

            As pessoas continuaram a caminhar. Alguns olhavam para a mulher, coberta por um lençol, que alguém trouxera rapidamente. Os carros foram desviados pela outra faixa. Lentamente, tudo voltava à normalidade. Então, ele sentou-se de frente ao computador e começou a dedilhar a nova história, com a impressão de que aquela seria o seu maior sucesso.   

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