Da janela do
apartamento, observava as pessoas que passavam lá embaixo, um amontoado de
gente, parecia mais umas formiguinhas caminhando, desordenadas, de um lado para
outro. Eram homens indo para o trabalho, mulheres levando os filhos para a
escola, adolescentes correndo para pegar o ônibus, camelôs atrapalhando a passagem
dos transeuntes. Todos os dias era a mesma coisa.
O
sino da igreja ainda não havia começado a trabalhar, pois ainda não deram as
sete horas. Alguns mendigos já perambulavam pelas ruas, enquanto outros ainda
dormiam debaixo da marquise do supermercado. As pessoas tinham medo dos
mendigos e, por isso, poucos passavam por ali, atravessando a rua, no meio dos
carros, para, depois, voltarem para o mesmo lado. Vez ou outra, um acidente acontecia.
Levantava-se
às cinco, pontualmente, todos os dias. Preparava o café; assentava-se de frente
a televisão e via as notícias dos jornais. Depois, às sete e trinta, saía para
comprar os pães e o jornal do dia. Voltava para casa e plantava-se diante do
computador. Era “encostado”, embora ainda não tivesse chegado aos quarenta. A
pressão do dia-a-dia o fizera ser encostado. Os médicos falaram em “Estafa”, ou
alguma coisa parecida.
Era
àquela hora, enquanto a cidade amanhecia, que colhia as suas história. Havia
virado cronista, por falta do que fazer. Punha-se à janela, escorado no
parapeito e ficava a observar a multidão alvoroçada. Sempre acontecia algo de
interessante, sempre surgia uma história para ser contada. Depois, lia os
jornais que comprava na banca de seu Arnaud, e enchia-se de desesperança perante
a sociedade. E seus textos eram lidos na internet, por um sem número de
pessoas, que o consideravam um Escritor.
Dessa
vez, contaria a história de uma mulher bonita, de longos cabelos encaracolados,
ruivos, que vestia um vestido florido, de alcinhas, cujo seios ele conseguia
visualizar de onde se encontrava, e eram durinhos, embora ela não mais fosse um
mocinha. Talvez já fosse uma balzaquiana; talvez vivesse no subúrbio; talvez
trabalhasse nalgum dos bordeis das ruas debaixo; talvez nem fosse tão bonita
assim.
Ela
seguia rapidamente o seu caminho, os cabelos balançando de um lado para outro,
o vestido bailando ritmicamente, sendo jogado de um lado para outro com as
trombadas dos transeuntes. A mulher dançava por entre as tantas pernas que
passavam, negando de todos, quase correndo. Talvez tivesse pressa de chegar;
quiçá, fugia de alguém que a perseguisse. Mas não se via ninguém à sua cola,
nenhum homem ou mulher.
De
repente, um grito! Ela saiu em disparada e jogou-se de encontro aos carros, que
vinham em alta velocidade, no cruzamento da rua com a avenida, lá embaixo, próximo
à loja de eletrodomésticos. O trânsito ficou embaraçado. Os motoristas xingavam
palavrões, pois chegariam atrasados ao trabalho. Um guarda chegou correndo;
conferiu o pulso; fechou-lhe os olhos e mandou, pelo rádio, um recado à
central: “Que viessem os peritos e a funerária.”.
As
pessoas continuaram a caminhar. Alguns olhavam para a mulher, coberta por um
lençol, que alguém trouxera rapidamente. Os carros foram desviados pela outra
faixa. Lentamente, tudo voltava à normalidade. Então, ele sentou-se de frente
ao computador e começou a dedilhar a nova história, com a impressão de que
aquela seria o seu maior sucesso.
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