Em meados de Maio o frio já começa a dar as caras. Não é um frio constante, mas uma sensação esquisita, que incomoda e adoece. Durante a noite faz frio; de madrugada congela, e de manhã, numa completa indecisão, quase neva à sombra e quase frita ao sol. O calor não permite que se vista uma jaqueta, assim como o frio não permite que se cubra com alguma mísera camiseta. Daí a lembrança do Karatê Kid: "Veste o Casaco, Tira o Casaco, Veste o Casaco, Tira o Casaco"...
Acho que o único que nunca vestira uma mínima camisa fora o Lúcio, meu vizinho. Fizesse frio ou aparecesse o sol, lá estava ele com o peito no tempo. Trabalhava na área da saúde e gabava-se de nunca ter-se adoecido; tomava, todas as tardes, duas garrafas de cerveja no boteco do meu pai e sempre me pagava dois reais para que eu apanhasse seu marmitex no restaurante. Adoecera uma única vez, e morreu sem se tratar e com o peito no tempo.
Contrariamente, Félix sempre andara bem vestido, prevenido contra os ventos e as intempéries. Vestia-se com elegância, com as roupas que ele mesmo fazia. Trajava suas calças sociais, suas camisas de botões e mangas longas e calçava uma sempre engraxada botina preta. Costumeiramente, assoava o nariz num lenço de seda que, ato contínuo, guardava, cuidadosamente dobrado, no bolso direito da calça. Parecia sempre estar doente, assim como aparenta até os dias de hoje.
Daqui a pouco Junho bate à porta. Daí é que o frio aperta. O vento começa a chegar junto com ele e entra pelas frestas do telhado, fazendo com que as mães tirem as cobertas de dentro do guarda-roupas. Algumas fedendo a mofo, outras cheirando naftalina. Os meninos colocam as toucas, vestem as calças de moletom e as blusas de frio. Não adianta sair o sol, o frio toma conta de tudo e aí é que se congela até a alma. Os homens é que sempre dão um jeito: nada que uma boa dose de pinga não possa resolver!
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