sexta-feira, 3 de setembro de 2010

AINDA MARIA


AINDA MARIA

As palavras são, verdadeiramente, seres frágeis que se desfazem junto ao vento diante da primeira investida de algum antigo sentimento. Eu disse que não falaria mais de Maria. A luta foi árdua e durante algum bom tempo consegui vencer a tentação de relembrá-la nestas poucas linhas. Sofri; certamente que tenho sofrido com as lembranças, e, o que é pior, com a relutância em dizê-lo a você, caro leitor.
Ontem a vi. Estava bela, vestida de forma simples, sem qualquer maquiagem ou exageros que marcam as mulheres de nossos dias. Não estava acompanhada, nem parecia entristecida; contrariamente, sua beleza fazia irradiar-se por todos os cantos em que passava e o que se sentia era uma alegria incontida, o que se mostrava no seu sorriso e em sua pele descansada.
Maria não me viu, nem tive coragem de mostrar-me a ela. Estava eu entristecido, cheio de rugas, de rusgas; cansado da imensa tristeza que me tomara desde o momento em que ela saíra de minha vida. Minto, ela não havia saído; continuava em mim, nos meus sonhos, nas minhas recordações, no meu choro diário; minha doce e meiga Maria se fazia transparecer, duramente, nas tantas rugas que se criaram em meu rosto.
Tive vontade de ir ao seu encontro; dizer-lhe do meu amor, dos meus sentimentos, da tristeza que toma a minha alma; quisera eu atravessar a rua, ajoelhar-me aos seus pés e suplicar a sua volta, o retorno incomensurável do seu amor. Não pude, faltou-me coragem, sobrou-me o pouco orgulho que ainda me resta.
Vendo-a repleta de beleza e alegria, ajuntei os meus cacos, recolhi toda a tristeza que caía de mim, em forma de lágrimas, e parti. Ao longe, com o coração em sobressaltos, ainda podia sentir o seu cheiro e toda a alegria que o acompanhava e, enquanto eu andava, o sorriso de minha doce e meiga Maria penetrava os meus ouvidos fazendo com que as lágrimas regassem minhas tristes rusgas.


Coração de Jesus, 27/08/2010

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