segunda-feira, 15 de agosto de 2011

PRESENTE ESPECIAL

O sol estava alto e fazia um vento seco no Planalto. Os carros passavam em alta velocidade levando pessoas apressadas, sem compaixão, com uma secura viva, no corpo e na alma. Mês de Agosto e a secura vive à mostra, como um brasão colado ao corpo, ao rosto, como se o organismo o tentasse expulsar de dentro de si, tarefa árdua e incloclusa. Esta era a imagem que ele via.
Ele vinha do Memorial, sentido Rodoviária. Estava cansado e não tinha nome. Se bem que o tinha, mas não fazia questão de nomear-se, seria apenas mais um entre tantos. O andar lento não era consequência da idade, era, por sinal, bastante jovem; queria apenas sentir o que se passava ao seu redor. Olhava as obras arquitetônicas, as belezas estilisticas de Brasília. Não se lembrava mais de quando chegara, não sabia mais o porquê de estar alí, não fazia a mínima ideia sobre aonde ia; andava apenas, como fazem muitos outros indivíduos.
Passou de frente à torre de televisão e sentiu vontade de entrar, subir até o alto, ver a cidade e as pessoas de lá. O sol estava quente e ventava. As pessoas eram pequeninas lá embaixo. Então, pensou consigo "como aquelas pessoas tão pequenas e insignificantes, poderiam querer ser melhores do que as outras?". E os pensamentos lhe vieram à mente, sentiu seu coração entristecer. Não sabia o porquê de estar alí. Talvez tenha vindo por causa de um emprego, por causa de um amor, por causa de um sonho... Agora estava alí, no alto, tão em cima e, ainda assim, igual a tantos outros!
A torre estava cheia, mas ninguém o via. Lembrara-se que outro dia fora o "dos pais". Ele não era pai. Nunca tivera um filho; nõ conhecia o seu pai, sua mãe; nunca tivera irmãos; nunca recebera um presente, de pai ou de aniversário; nem sabia quantos anos tinha. Chegara à conclusão de que nunca fora feliz; que nunca tivera uma vida; que não deveria estar alí. Ele quis gritar; mas teve pudor. Sempre fora assim; nunca tivera coragem para tomar uma decisão, dar o primeiro passo, tomar a iniciativa.
Enquanto olhava a cidade e pensava, veio-lhe à mente a ideia de liberdade. Nunca fora livre de verdade. Sempre estivera preso às regras, aos ditames de outrem. Agora poderia ser livre, voar, buscar a felicidade. Se nunca lhe deram, haveria de ele mesmo se dar um presente, um presente especial, a liberdade. E, antes que dessem conta de si, subiu nas grades da torre e pulou. Nos instantes em que caía, sentiu a felicidade bater-lhe na cara e descobriu, verdadeiramente, que não era somente mais um em meio a multidão; era um presente especial.

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