quinta-feira, 8 de setembro de 2011


A VIDA E OS SONHOS


Treze anos somente, era esta a sua idade. Caído ao chão, com o sangue escorrendo-lhe pelo asfalto quente. Seria apenas mais um corpo estendido no chão, ou um número a mais nas vastas estatísticas de morte no país, não fosse aquele indivíduo uma simples criança a descer a rua em sua bicicleta para buscar leite. A vida por um litro de leite, nas rodas de uma bicicleta, no parachoque de um caminhão.
Um homem chega numa motoneta, talvez o pai, com a difícil tarefa de reconhecer o corpo. Treze anos somente, era esta a sua idade. Talvez tenha ido à Esplanada no dia de ontem, com  a mãe, o pai e uma irmã ainda pequena; talvez tenha pegado todo aquele sol da manhã para ver os militares marchando pela avenida e tenha se sentido feliz ao ver os balões levantando voo com o crepitar das chamas em seu interior. Era apenas uma criança e crianças são seres ingênuos e, pasmem, ainda felizes.
Os transeuntes olham. Veem apenas um corpo estendido sobre o asfalto quente, coberto por uma grande folha de papel, antes branca, toda suja de sengue. Conversam entre si; reclamam do governo; das injustiças da vida; do tempo quente que faz em Brasília. Não pensam no menino que, certamente, jogava bola pelas ruas com outros meninos; gostava de ver televisão e jogar videogame; que tinha uma namoradinha na escola e sonhava ser jogador de futebol, ser rico e famoso. As pessoas não sabem de tudo isso.
As redes de TV brigam pela melhor imagem. Querem o ângulo mais atraente. Não sentem a dor, não veem que os sonhos ainda sobrevoam o lugar; rodeiam-no, talvez a espera de que se levante, pegue-os e volte a alimentá-los. Treze anos somente e muitos sonhos a serem realizados. Sonham que voam lentamente, talvez em busca de um outro menino, uma outra alma em que possam se instalar e viver plenamente. A polícia chega e os curiosos se esvaem. Compro o meu jornal e sigo. Mas os sonhos ainda continuam em busca de uma nova casa pra morar.

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