AINDA
O SUMIÇO DO ARNALDO
O Arnaldo sumiu. Não tive notícias; não sei se
fugiu ou se sumiram com ele. A esposa não apareceu. Apenas
ontem esteve em minha casa, trazendo a triste notícia. Fiquei
com pena do Arnaldo, pois sei que na condição em que
estava não deveria ter desaparecido. Mas, confesso, senti uma
ponta de alegria ao pensar que sua esposa agora estaria livre pra
mim. Agora, no entanto, sinto-me receoso por não saber do
pobre diabo. E se estiver morto (coitado!)? E se estiver vivo e me
vier procurar? Não tenho nada com a mulher, mas...
Hoje sai
cedo. Levantei-me; tomei o café; arriei o cavalo e fui. Andei
pelos matos, em busca do Arnaldo, de alguma notícia, de alguma
pista que me levasse ao seu paradeiro. Nada; nenhuma pista sequer.
Ninguém sabia do homem, apenas que sumira. Passei pelos lados
de sua casa, pensando encontra-lo pelas redondezas ou, quem sabe,
encontrar sua esposa; perguntá-la sobre notícias,
oferecer a ela os meus préstimos...
A casa
estava fechada. Nenhum barulho, nenhum movimento; apenas um silêncio
profundo. Aquela é uma casinha triste, pequena com paredes de
adobe, portas e janelas minúsculas, de madeira, telhado baixo
comum e tinta branca, bastante velha na parede. Não pude
deixar de notar o jirau, no quintal, seco, sem motivo de vasilhas ou
panelas, como se há dias ninguém habitasse àquela
morada. Bati à porta de uma vizinha. Disse não saber do
Arnaldo nem de sua esposa. Achava que ela estivesse na casa de uma
conhecida do outro lado da cidade, mas não me dera certeza...
Voltei
para casa com ideias na cabeça: e se o meu amigo não
tivesse fugido? E se a esposa o tivesse matado?... Mas por que
haveria de fazê-lo, se ele era o ciumento; se ela era a beleza
dela que lhe dava os motivos de desconfiança? Pensei em
dinheiro; mas o coitado era pobre, não tinha heranças
nem posses. Pensei em vingança, mas não achava motivos
para tamanha barbárie. Não. Não haveria de ser a
pobre mulher uma assassina. Sua beleza não lhe permitiria
cometer tal loucura!
No
hospital me disseram que não tinham qualquer responsabilidade
sobre o acontecido; que o homem havia saído pela porta da
frente, por vontade própria, enquanto o porteiro fora ao
banheiro. Ninguém o vira saindo, mas era a única
maneira de fazê-lo. Penso que venha ao meu encontro, ou para
matar-me ou para pedir-me algum conselho. Quando vier, se para
brigar, brigamos; se para aconselhar-se, bebemos.
Sentado,
agora, no banco da varanda, olhando a rua com seus movimentos
habituais, lembro-me do meu amigo, das noites de farra; dos sonhos em
comum; dos banhos de rio... Mas, no meio das divagações,
eis que me surge sua esposa, com seus olhos verdes, seus cabelos
negros e seu corpo perfeitamente esculpido pela natureza. Tento
desviar meus pensamentos, mas as ideias convergem para o mesmo ponto,
querem vê-la, tocá-la, senti-la carnalmente. Levanto-me;
vou à estante, pego a melhor pinga, despejo-a no copo até
a boca e tomo numa única golfada. A pinga desce ardendo no
peito e ela desaparece.
Volto ao
banco. As pessoas sobem e descem a rua tranquilamente. Todos me
olham, cumprimentam e passam. As lembranças da esposa do
Arnaldo voltam, mas não as afasto; fixo os olhos na ponta da
rua, lá em cima, na esperança de que o amigo apareça,
que venha triste, com seu andar humilde, chegue devagar e cabisbaixo
e, ainda no pé da escada, me diga:
- Amigo,
hoje quero a melhor pinga, que é pra esquecer de vez aquela
cadela!
E por onde anda o Arnaldo...Espero que não esteja tramando a morte do seu melhor amigo
ResponderExcluirRenato Cheloni