MINHA
VISITA AO ARNALDO
Hoje fui ao hospital. Senti-me na
obrigação de visitar o meu amigo Arnaldo. Por pouco não
contive o choro. O pobre coitado estava adormecido sobre a cama. Era
um quarto simples, sem conforto e sem muita esperança. Tinha
ele muitos hematomas pelo corpo; o olho direito arroxeado pelos socos
e pontapés que lhe foram desferidos. A face estava bastante
inchada e a respiração a mim parecia bastante
dificultosa.
A
sua esposa não se encontrava no quarto. Saíra um pouco
antes da minha chegada e eu ainda podia sentir o seu cheiro
perfumando todo o quarto. Era um perfume agridoce, uma mistura de
romantismo e de pecado. Senti meu peito palpitar, minha pele
estremecer e o suor descer pela minha testa franzida. Tentei esconder
minha inquietação. O meu amigo estava desacordado – e
éramos somente ele e eu naquele quarto – mas eu sentia que
ele escutar o pulsar acelerado do meu coração, minha
respiração ofegante, quiçá, sentir meu
desconforto naquele instante.
Cheguei
mais perto do leito e, a cada mínimo instante, sentia mais
fraca a sua respiração. Tive pena e raiva daquele
homem, inválido, sobre a cama. Pensei pegar o travesseiro e
acabar de vez com aquela situação. Não podia!
Aquele homem era meu amigo. Afinal, havíamos crescido juntos,
tínhamos toda uma vida de amizade. Era eu o seu mais fiel
confidente e, pobrezinho, também seu maior algoz.
Sentei-me
em uma cadeira, colocada ao lado do leito, segurei a sua mão e
peguei-me a relembrar o passado: a sua chegada à fazenda,
ainda novo; as corridas no pomar e os banhos de rio; as idas à
cidade, em busca de festas e raparigas; os sonhos e desenganos de
ambos; o encontro com aquela menina desajeitada e bonitinha, que
todos os dias chegava cedo à fazenda, cozinhava e cuidava da
casa e depois ia embora, pela qual o Arnaldo guardava uma paixão
incessante e, mais tarde, com minha ajuda, viria a ser sua mulher.
Pobre
amigo! Agora estava ali, deitado sobre aquela cama, sem um futuro
certo, sem rumo, contando apenas a minha amizade e o amor de sua
esposa. O choro me veio novamente à mente. Segurei, bocejei
para espantá-lo. Levantei-me, peguei o chapéu e fiz
menção de me retirar.
Já
me despedia do Arnaldo quando ela chegou. Não disse nada;
apenas veio ao meu encontro e, silenciosamente, abraçou-me.
Esfriei-me ao sentir o seu corpo junto ao meu. Seus seios tocando meu
peito; suas coxas juntas às minhas, suas partes unindo-se a
mim. Abracei-a silencioso e sentir profundamente àquele
instante, ainda que um pouco receoso, talvez temeroso de que o amigo
se levantasse daquela cama de lençóis embranquecidos.
Sem
dizer qualquer palavra, retirei-me do quarto. Fui para casa
devagar,flutuando em meus devaneios, observando os pássaros,
as flores, relembrando o Arnaldo e nossa amizade. Da minha roupa
suada subiu um perfume agridoce, um cheiro de mulher; o cheiro da
mulher do Arnaldo!
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