sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

MINHA VISITA AO ARNALDO

MINHA VISITA AO ARNALDO
MINHA VISITA AO ARNALDO


Hoje fui ao hospital. Senti-me na obrigação de visitar o meu amigo Arnaldo. Por pouco não contive o choro. O pobre coitado estava adormecido sobre a cama. Era um quarto simples, sem conforto e sem muita esperança. Tinha ele muitos hematomas pelo corpo; o olho direito arroxeado pelos socos e pontapés que lhe foram desferidos. A face estava bastante inchada e a respiração a mim parecia bastante dificultosa.
        A sua esposa não se encontrava no quarto. Saíra um pouco antes da minha chegada e eu ainda podia sentir o seu cheiro perfumando todo o quarto. Era um perfume agridoce, uma mistura de romantismo e de pecado. Senti meu peito palpitar, minha pele estremecer e o suor descer pela minha testa franzida. Tentei esconder minha inquietação. O meu amigo estava desacordado – e éramos somente ele e eu naquele quarto – mas eu sentia que ele escutar o pulsar acelerado do meu coração, minha respiração ofegante, quiçá, sentir meu desconforto naquele instante.
        Cheguei mais perto do leito e, a cada mínimo instante, sentia mais fraca a sua respiração. Tive pena e raiva daquele homem, inválido, sobre a cama. Pensei pegar o travesseiro e acabar de vez com aquela situação. Não podia! Aquele homem era meu amigo. Afinal, havíamos crescido juntos, tínhamos toda uma vida de amizade. Era eu o seu mais fiel confidente e, pobrezinho, também seu maior algoz.
        Sentei-me em uma cadeira, colocada ao lado do leito, segurei a sua mão e peguei-me a relembrar o passado: a sua chegada à fazenda, ainda novo; as corridas no pomar e os banhos de rio; as idas à cidade, em busca de festas e raparigas; os sonhos e desenganos de ambos; o encontro com aquela menina desajeitada e bonitinha, que todos os dias chegava cedo à fazenda, cozinhava e cuidava da casa e depois ia embora, pela qual o Arnaldo guardava uma paixão incessante e, mais tarde, com minha ajuda, viria a ser sua mulher.
        Pobre amigo! Agora estava ali, deitado sobre aquela cama, sem um futuro certo, sem rumo, contando apenas a minha amizade e o amor de sua esposa. O choro me veio novamente à mente. Segurei, bocejei para espantá-lo. Levantei-me, peguei o chapéu e fiz menção de me retirar.
        Já me despedia do Arnaldo quando ela chegou. Não disse nada; apenas veio ao meu encontro e, silenciosamente, abraçou-me. Esfriei-me ao sentir o seu corpo junto ao meu. Seus seios tocando meu peito; suas coxas juntas às minhas, suas partes unindo-se a mim. Abracei-a silencioso e sentir profundamente àquele instante, ainda que um pouco receoso, talvez temeroso de que o amigo se levantasse daquela cama de lençóis embranquecidos.
        Sem dizer qualquer palavra, retirei-me do quarto. Fui para casa devagar,flutuando em meus devaneios, observando os pássaros, as flores, relembrando o Arnaldo e nossa amizade. Da minha roupa suada subiu um perfume agridoce, um cheiro de mulher; o cheiro da mulher do Arnaldo!

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