terça-feira, 27 de março de 2012

BAÚ DE SAUDADES


BAÚ DE SAUDADES



Mário Quintana, um grande poeta gaúcho, escreveu, em última hora, um livro denominado Baú de Espantos. Versava sobre a vida, seus encantamentos e, principalmente, sobre o seu desassossego ante a vida e suas intermináveis surpresas. Por isso, talvez, fizera versos encantadores, ao mesmo tempo incrédulos e esperançosos, numa eterna contradição. Mas, quem somos nós para falarmos de contradição; seres tão paradoxais, contraditórios, seres tomados de pura poesia.
Minhas Crônicas não têm a pretensão de um Quintana. Querem apenas recontar a vida, do meu modo, da maneira que a vejo e vivo. Minhas Crônicas pretendem apenas retratar os sentimentos, os encantamentos, as saudades do meu peito. Saudades que se fazem em forma de poesia, de lágrimas, de sorrisos, em forma de palavras desconexas, despudoradas; palavras jogadas bruscamente ao léu, ao deus-dará, aos ventos do destino.
O poeta construía o seu texto durante todo o dia; labutando, esmerando as palavras e os sentimentos, como se fosse um ourives a trabalhar a mais fina aliança; não entre pessoas, mas um elo entre o homem e o seu sentimento, o pecado e a pureza, a vida e a morte. Eu, por preguiça ou pela pressa de me expressar, não trabalho, não expresso, apenas escrevo, toscamente, e deixo que as palavras se organizem por si mesmas, como se já estivessem prontas, acabadas, amadurecidas pela vida.
Ele sofre para parir e depois guarda cada uma de suas crias dentro de um grande baú de espantos. Eu não sofro, não trabalho; apenas escrevo-as e jogo dentro do meu baú, uma redoma fria e tétrica, onde não há esperança, encantamento ou surpresas, apenas um baú de saudades; tomado por rememoranças de tempos idos, onde tudo era igual o presente, mas que, tolo, insisto em pintar paradisíaco, numa eterna nostalgia.
Pobre poeta e seu baú de surpresas. Não sabe ele que a vida nada mais é que apenas uma interminável repetição, um grande caminho que circundamos sempre na esperança de que algum dia o destino mude e alguma surpresa aconteça de verdade. Nada acontece e, então, olhamos para trás, com a vazia sensação de que tudo poderia ser diferente. Ledo engano!

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