segunda-feira, 19 de março de 2012

REFLEXÕES MATINAIS

REFLEXÕES MATINAIS


      Mais um dia de chuva. Os pássaros, apenas alguns poucos pardais, barulharam logo cedo à minha janela. O cheiro do café coado vinha saboroso da cozinha e junto dele o cheiro da terra molhada, vinda lá do quintal, junto à mangueira e o laranjal. O pé-de-acerola fica mais para o fundo, perto do córrego que passa rente às terras do meu compadre.
     A cama ainda estava quente do lado dela. Era ela quem preparava o café, se bem que a empregada poderia muito bem fazê-lo. Desde que estava em casa, preparava o café e trazia no quarto, onde tomávamos e depois brincávamos, até que o Juca me viesse chamar para a lida no campo. Minhas manhãs ficaram melhores, mais quentes e preguiçosas ao lado dela. 
     Sim. A mulher do Arnaldo ainda está em casa. Não; não sei ainda do paradeiro do sujeito. As notícias chegam desencontradas, algumas dizem que ele está pelos lados do Bom Jesus da Lapa; outras que ele anda tocaiado por essas bandas mesmas, a esperar por um descuido meu. Há, ainda, aquelas que dizem que ele esteja morto e que a assassina é a esposa. Nesta última não acredito, embora uma pontinha de dúvida, vez ou outra, me ataque. 
      Hoje a mulher do Arnaldo levantou ainda escuro. Fez o café e trouxe até o quarto. Notei que estava estranha, meio arredia, pensando longe de nós. Pensei que pudesse estar com saudades do Arnaldo, mas não disse nada; melhor não remoer o que esteja no passado. Fiz-lhe alguns carinhos, mas, rapidamente, ela foi se esgueirando. Não retruquei; fiquei a olhá-la apenas, a espera que me dissesse algo. Não disse e ficamos ambos calados.
      A verdade é que o homem ainda nos assusta. Meus dias ficaram mais bonitos, mas, ao mesmo tempo, ficaram mais temerosos. O Arnaldo desapareceu, mesmo assim continua no meio de nós. À noite ela tem pesadelos, grita, chora e diz que não tem culpa naquilo. Não sei de que se trata, qual o seu sonho, mas temo que seja relacionado ao meu amigo. 
       O cheiro do café ainda é forte e ela ainda está na cozinha. Deve estar lavando as vasilhas, enquanto chora silenciosa. Fico a pensar em que pensa, se em mim, no Arnaldo ou em algo alheio a ambos. Confesso; tenho ciúmes dela. Não com o Arnaldo, mas com outro; Talvez um terceiro, algum outro amigo e... reflito... se ela fizer comigo o que dizem ter feito com o meu amigo?...

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