O
CRAQUE DO TIME
Algumas coisas
intrigam, e sempre intrigarão, os homens. E encaixo esta palavra aqui como, de
acordo com o meu amigo Aurélio, “ato de causar intriga”. Dentre estas coisas
estão a religião, a política e o futebol.
Tenho alguns amigos
que se inimizaram com outros por causa de algumas destas três instituições;
igual àquele que brigou com o melhor parceiro de truco porque o outro era
argentino e cismava sempre que o Maradona era melhor que Pelé. Convenhamos, nem
se teria começado a discussão se ambos tivessem visto o futebol do Getulinho.
Aquilo é que era jogador!
Getulinho era filho
de Dona Maguianor e de Seu Jordelino. O moleque não era alto nem forte; não
tinha o cabelo espetado nem usava brinco na orelha; não jogava em qualquer time
grande nem tinha empresário. Getulinho era um dos nossos. Era o nosso camisa
10. O craque do time.
Muitas foram as vezes
em que o craque pegava a bola no meio do campo; passava por dois, driblava o
terceiro, dava uma caneta no zagueiro, um lençol no goleiro e corria pra
galera. Mas não servia apenas de goleador; dava passe de letra, de calcanhar,
de cabeça, assistia a maioria dos gols do nosso time. É verdade, era o
Getulinho quem mandava e desmandava nas quatro linhas.
O problema é que ele
nunca sonhara em ser jogador de futebol. O cara queria mesmo era ficar rico.
Sua família era pobre, o pai era lavrador e a mão lavava roupas para fora. O
único filho era ele, por isso tinha que ajudar em casa. Trabalhava
das sete da matina até às seis da tarde e, só depois, já cansado, é que ia para
o campo conosco.
Aos domingos ia à
igreja de manhãzinha e às segundas ia à câmara, na hora do almoço, assistir a
uma parte da sessão plenária. Pegou amizade com um político da ala religiosa e
largou o futebol. Partiu para a política, virou religioso e deixou o futebol de
lado. Hoje está rico e temeroso a Deus. Nós perdemos o nosso maior craque e,
por falta dele, o time chegou ao fim. Ainda tentaram me colocar em seu lugar.
Mas faltava fé, diplomacia, faltava o peso da camisa 10, o talento do Getulinho.
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