Sentada
de frente à penteadeira, ela penteava os seus cabelos e lembrava-se de quando
era jovem. Os cabelos, agora brancos, já foram negros, quase como as asas da
graúna, assim como o seu coração já fora duro, como a mais dura rocha que se
pode encontrar. E, enquanto se penteava, uma lágrima, solitária e preguiçosa,
descia pelo seu resto, passeando pelas rugas de uma pele que antes fora a mais
macia e cobiçada dentre todas as mocinhas de quinze anos.
E a
sua lembrança veio à mente. Dos seus olhos tristes, em quando se separaram; do
seu sorriso sem jeito; dos seus olhos cheios de lágrimas. Ela sorria, enquanto
ele, cabisbaixo, descia a rua, com suas roupas dentro de uma velha sacola de
supermercado. Ela não o amava. Não com
todo aquele ardor, não naquele momento. Depois, quando já não podia tê-lo,
bateu a saudade, veio a dor. Veio a sensação de que aquele era o seu amor.
Ele já
não existe. Vivera a vida, ainda que tristemente, buscando sonhos, iludindo-se
pela vida a fora. Ela, sentada de frente à penteadeira, escovava os longos e
lisos cabelos brancos, enquanto as lembranças povoavam a sua mente. Lembrava-se
do seu corpo sobre o dela, das suas bocas se tocando, dos seus olhos brilhando,
como se tudo aquilo fosse apenas um sonho eterno. Mas tudo se acabara.
A enfermeira viera buscá-la.
Não disse qualquer palavra; deixou que a levassem para o banho de sol, naquela
manhã fria de Julho. Numa árvore próxima, um passarinho parecia observá-la. E
ela pode ver, os olhos dele eram tristes, como de alguém que tivesse amado e se
desiludido; como de alguém que se jogara de cabeça e se machucara. De novo uma
lágrima desceu dos seus olhos. Ela passou a mão sobre o seu rosto enrugado e
pensou que nada daquilo valera a pena. Nada.
Grande Elismar, adorei o texto!
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