Ao
longe, as folhas de bananeira balançam-se ao bel sabor do vento; um ou outro
carro passa pela rua, enquanto o barulho de uma enxada arrasta-se no asfalto e
alguns cachorros latem mais ao longe ainda. O sol nasce timidamente pelos lados
da lagoa, enquanto o friozinho de Julho vem bater à janela, como se quisesse
refrescara alma.
Os
pássaros, nesta manhã, ainda não chegaram. O pato ainda dorme debaixo da
goiabeira, enquanto os sonhos ainda povoam as casas vizinhas. Daqui a pouco, os
sonhos irão embora, os bichos acordarão, os pássaros chegarão e, finalmente, a
vida reiniciará.
Da
janela, olho a rua e sua solidão. Vez ou
outra, uma alma penada desce a rua; um ou outro trabalhador segue para a roça;
um ou outro sonho recolhe-se à sua insignificância. E quase todo o dia será
assim. Mais tarde, abrirão-se os botecos, as mulheres farão o almoço, as
crianças ligarão os aparelhos de TV. E tudo continuará como sempre fora, e
será.
As
mesmas músicas serão tocadas nos botecos; os mesmos assuntos serão retomados:
os bêbados falarão sobre futebol, mulher, política; um, mais exaltado, mexerá
com a mocinha, de bunda grande e seios fartos, que passará lentamente, talvez
indo comprar o macarrão ou a carne para o almoço. Outro pedirá mais uma
cerveja, uma branquinha pra esquentar o frio, um cigarro para espantar as
muriçocas. E tudo continuará como sempre fora, e será.
Às nove,
em ponto, um avião deixará um rastro de fumaça nos céus, e, cortando as nuvens,
levará algum deputado para Brasília. Algum poeta ligará o rádio para ouvir as
notícias da Capital, enquanto alguém soltará um grito de felicidade numa rua ao
longe, e outro o ecoará até a outra rua, para que outros gritos se ecoem pela
cidade, como se fossem os galos da manhã a tecerem a vida de sempre.
E
assim, passarão os dias, até que a vida não mais exista; até que os sonhos se
tornem lembranças e a única esperança que ainda exista seja a de que tudo, um
dia, termine bem. Talvez os pássaros ainda continuem a cantar na goiabeira;
talvez as folhas da bananeira continuem a ser balançadas pelo vento, e, quem
sabe, talvez a menina, de bunda grande e seios fartos, já velha e solitária,
ainda passe pela rua, a espera do bêbado, que não mais exista para cantá-la.
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