Nestes dias tenho evitado
sair à rua. Prefiro ficar em casa, sentado no velho banco da varanda, tomando
minha cachaça, olhando a lagoa, pensando nos problemas dos outros. Também tenho
lembrado o meu amigo Arnaldo. Vez ou outra a sua minha esposa senta-se ao meu
lado e ficamos olhando a paisagem. Ela não diz qualquer palavra, mas sei que
ainda se lembra do marido. Respeito a sua dor, ainda mais que nem uma notícia
dele nos tem chegado.
Se o Arnaldo, de fato, não
mais estiver entre nós, embora seja grande a minha dor, aprazo-me por ele não
ver as tantas enrascadas pelas quais o brasileiro tem passado. Se vivo estiver,
imagino a sua dor ao ver tanto desmando numa única nação. Da minha parte, em
nada me afetam a Terceirização, a Previdência e a Reforma Trabalhista: do que
tenho guardado, vivo por mais algumas boas gerações.
O amigo, a quem um dia ainda
espero encontrar, para juntos tomarmos algumas doses de cachaça e comermos os
quitutes da minha sua esposa, era, realmente um sujeito solidário. No seu jeito
simples e direto, o Arnaldo diria que tudo isso é culpa do povo, culpa nossa,
que não sabemos votar e nem cobrar dos nossos políticos.
De certa forma, eu haveria
de concordar com o amigo; mas ele certamente continuaria dizendo que ainda é
tempo para se consertarem as coisas, que bastaria o povo ir para as ruas,
protestar, cobrar, gritar, espernear os seus direitos e o seu futuro. Ele era
mesmo um visionário! Era um pobre coitado que sempre acreditara na força do
povo para reverter os problemas da nação.
No fundo, eu até concordo
com as ideias do Arnaldo; mas prefiro ficar quieto no meu canto, a espera de
alguma solução plausível. Por enquanto, contento-me com os afagos da minha
esposa do amigo e fico sempre de espreita, no aguardo de quando ele há de
chegar, com seu jeito matuto, pedindo mais um copo de caninha.
Parabénsss, amigo, pelo ótimo espaço de difusão das letras. abços
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