sexta-feira, 19 de maio de 2017

BRAZIL

Não importa contra o quê, o importante é vestir a camisa da seleção, colocar o bonezinho vermelho na cabeça e sair pelas ruas gritando palavras de ordem. Catarina sempre cultivara este pensamento. Tendo estudado durante toda a vida em escolas particulares, e há alguns anos tentando vestibulares pelo país afora, sempre se sentira revoltada com a situação política do Brasil, até porque, para ela, esse é o ponto central de todos os nossos problemas.
Quando criança, ainda no Ensino Fundamental, criara um jornalzinho escolar: “O Crudelíssimo”, onde expunha toda a sua ira contra a direção da escola. Para ela, a Educação era coisa muito séria para ficar nas mãos de um diretor, dois vice-diretores e alguns cinco membros do Conselho Escolar; o ideal seria a participação de todos os alunos em todas as tomadas de decisões do educandário, afinal, eram eles os principais interessados no assunto.

Em protesto contra as ações “ditatoriais” do comando escolar, por algumas vezes, organizara manifestações no pátio, na hora da merenda, sempre gritando palavras de ordem junto de alguns gatos pingados; sendo que sua ação de maior monta fora também a sua expulsão do educandário, quando, junto de quatro outras garotas, saíram pelos corredores despidas de suas blusas, sem mesmo peitos terem para mostrar.

O Ensino Médio abandonara por várias vezes, tendo dado grande prejuízo ao pai, um grande empresário do ramo de alimentos. Por algum tempo fora morar com os índios, depois, passara uma temporada numa colônia Hippie e, por fim, ingressara num movimento social que lutava pelos descamisados do Brasil. É bem verdade que todos estranhavam as suas roupas de grife, seu telefone caro e seus perfumes importados, mas ninguém queria perder as suas gordas doações.

Ao assistir aos protestos de ontem, pela televisão, vi que Catarina também estava lá, com sua velha blusa da seleção, seu bonezinho vermelho e sua calça de marca. A câmera da tevê dispensara todo o seu foco naquela moça, talvez com seus trinta e alguns anos, filha de um grande empresário, que se dizia revoltada com a situação política do Brasil e, feito uma louca, abraçava-se ao pára-brisa de um carrão, sendo arrastada para alguns metros adiante.


De acordo com o âncora, Catarina passa bem e já está em casa, num condomínio da Zona Sul da cidade. O seu pai, assistindo a tudo aquilo pela tevê, pede a todos os santos que a PF nunca apareça na empresa, senão, ele estará em maus lençóis. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário