terça-feira, 16 de janeiro de 2018

JANEIRO

As alpercatas lhe apertavam os pés, por isso, tirou-as e continuou a caminhar. Sol quente de janeiro. Certamente, choveria mais tarde: chuva grossa, com raios e trovoadas. Tinha que chegar em casa logo, mas toda aquela areia em nada o ajudaria. Se pelo menos tivesse um cavalo. Nem isso... Nem isso fora capaz de adquirir!

            Quando viera para o norte, trabalhar nas carvoeiras, tudo era verde. Ganhara muito dinheiro. Tinha mesmo ficado rico. Andava com o bolso cheio de notas, chapéu de massa na cabeça e pagava pinga pra todo mundo no boteco de Cristiano. Depois, pouco tempo depois, tudo aquilo se transformara num grande deserto. Uma sequidão só.

            Um espinho lhe enfiou no pé. Espinho desgraçado. A areia estava quente. Se andasse descalço, estrepava o pé; se andasse calçado, não se aguentava de dor. Um cavalo resolveria o seu problema. Já tivera um carro. O fusquinha andava atolado de gente. Durante o dia trabalhavam; à noite, iam pro boteco. No caminho, passavam no rio e tomavam  banho, homens e mulheres, todos juntos, feito bicho no meio do mato.

            Os rios, quase todos secaram. Dos amigos, os que não morreram, alguns se casaram e foram embora para a cidade. Ele nunca quisera ir. Queria queimar o carvão e ficar rico de novo. Compraria uma casa na cidade, um carro e uma bicicleta. Sempre quisera uma bicicleta, mais até que um cavalo. Mas tinha que ser na cidade. Naquele areião não dava pra andar de bicicleta.

            O sol continuava quente, mas algumas nuvens já se ajuntavam por perto. Dentro de pouco tempo choveria. E ainda estava longe de casa. Maldito cavalo. Até queria voltar pro Jequitinhonha. Não podia. Não desse jeito. Tinha que trabalhar mais, ganhar algum dinheiro; daí voltaria pra lá. O carvão ainda daria para algum tempo. Depois, tudo viraria deserto. E o jeito era voltar.


            A chuva estava chegando. Um rancho abandonado bem na beira da estrada. Tinha que entrar e esperar a chuva passar. Muita gente abandonou os ranchos. Também, com essa miséria de salário. Se tivesse um cavalo, já estaria em casa. Mas, de que adiantaria?! Não tinha mulher, nem filhos. Nem mesmo um cachorro tinha mais. Piranha era um bom companheiro. Cobra desgraçada. Apesar da chuva, fazia calor dentro do rancho. Sentou-se a um canto, destampou a garrafa e tomou um trago. Se tivessem mais árvores, a chuva seria mais bonita. 

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