quarta-feira, 27 de junho de 2018

JUCA PESSOA - CAPÍTULO 8



Elismar Santos


Já fazia cerca de um mês, senão mais, que Juca perambulava pelo sertão. Não fazia a mínima ideia de onde estava, se seguia para a margem de algum rio ou se se embrenhava mato adentro pelos sertões. Lembrava-se do ribeirão que viera seguindo até certa parte do caminho; depois, enquanto mais se afastava dele, perdia, rapidamente, as suas orientações. As árvores, a vegetação, a terra, tudo era exatamente igual até ali: tudo era extremamente seco e sofrido.

O sol, sempre forte e perverso, parecia desnorteá-lo e a cada dia lhe parecia nascer de um lado diferente. O homem já não era capaz de retornar à sua casa, assim como também não tinha mais a capacidade de chegar a lugar algum por seus próprios conhecimentos. Andava a esmo, observando os pássaros e o vento; às vezes, sentia como se estivesse andando em círculos, num terrível labirinto. Daí, num de seus tantos pensamentos já desencontrados, chegara à terrível conclusão de que o sertão é um grande monstro pronto a engolir os seus filhos. 

Juca já não tinha forças suficientes para seguir. Já não andava mais que duas ou três léguas num único dia; deixava que o cavalo o levasse de acordo com a conveniência do animal. Assim, arrastavam-se, ambos, pela estrada durante uma parte do dia; depois, desfazia os arreios, soltava o bicho e deitava-se debaixo de algum pequizeiro, na esperança de que alguma coragem lhe viesse ao corpo. De noite, sentia febre, e o couro já não lhe era capaz de esquentar, assim como não o fazia o fogo. Não tinha medo de morrer, e esse pensamento até apaziguava um pouco a sua alma.

Certa noite, enquanto queimava em febre à beira da fogueira, dentro de uma pequena gruta, sentiu uma mão macia tocar-lhe a testa. Abriu os olhos com alguma dificuldade, limpou o suor que lhe escorria pelo rosto e levantando um pouco as vistas, viu que a mãe o afagava carinhosamente. Tentou se levantar, mas, ela segurou-o com firmeza, fazendo com que permanecesse quieto em seu canto. Um calor ardente lhe queimava o corpo.

- A benção, mãe. – E sua voz lhe pareceu fraca, como a voz de quem já não tinha forças nem mesmo para respirar.

- Deus te abençoa, meu filho.

A voz da mãe ainda lhe era macia como das outras vezes que a ouvira. Mas agora lhe parecia ainda mais branda, com um cheiro de rosas e tomada pela tranquilidade que apenas as vozes maternas possuem. Não estava delirando; tinha a certeza de que aquela era mesmo a sua mãe. Não em carne e osso, mas, talvez o seu espírito, que viera lhe amparar num momento de fraqueza e desilusão.

- Não tenho mais forças, mãe. Não consigo mais. Tenho que me entregar.

- Você ainda não cumpriu a sua missão, meu filho. Aguenta, que eu estarei com você.

Juca compreendeu que sua mãe agora era uma parte de si. Fechou os olhos e chorou copiosamente, deitado no seu colo. Depois adormecera, tranquilo e protegido, como quando morava com a velha, à beira do riacho.

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