quinta-feira, 22 de novembro de 2018

O ANONIMATO E A DISTÂNCIA


Talvez o mais decente para um escritor seja, realmente, o anonimato e a distância; pois, assim, não se misturam o autor e a obra, o autor e o personagem, o autor e os autores. E isso sempre é conveniente saber: poder parecer piegas, maçante, manjado mesmo; mas, de fato, cada leitor é deveras um autor. Por isso, quando escrevo e publico, deixo logo de ser o pai da criança e, por conseguinte, concordo com todas as interpretações possíveis e plausíveis.

Da mesma forma, enquanto leio João Ubaldo Ribeiro, Vinícius de Moraes ou Christian Carvalho Cruz, interpreto-os de acordo com minhas mais convictas emoções, de acordo com as minhas mais prováveis compreensões, confundindo, por vezes, Autor – Personagem – Obra. Por isso, não culpo os leitores que me imputam o sumiço do Arnaldo, que me veem como um poeta inveterado, como uma cópia imperfeita de Guimarães Rosa e Jorge Amado. A interpretação é a conveniência do leitor-autor e, portanto, a mais pura verdade, ainda que sejam concretas inverdades.

Faço, então, a mea-culpa: também eu crio meus leitores; também eu sou um leitor inveterado daqueles que me leem os textos. E talvez por isso eu os conheça tão bem, embora sempre à minha maneira, conversando, silenciosamente, por vezes, com este ou aquele, pedindo, ainda que intuitivamente uma opinião, fazendo parcerias, escrevendo a mais mãos aquilo que uma não faria com tanta dignidade.

Talvez o mais decente seja, realmente, o anonimato e a distância, pois, desta forma, não saberá cada leitor-autor que durante um espaço de tempo, em frente ao computador, todos eles se escrevem nas linhas de uma Crônica ou nos versos de um poema, para em seguida serem jogados, sem qualquer tipo de piedade, nas entranhas das redes sociais, para serem desfeitos e recriados por tantos outros autores, sendo compreendidos das mais diferentes maneiras, de todas as formas, em todas as suas crudelíssimas veracidades.

E talvez isto seja o mais justo, uma vez que nestes caminhos tão turbulentos e tortuosos, de que adiantaria a lida, se todos não caminhássemos juntos, se não falássemos a mesma língua, com nossos tantos sotaques e pensamentos, se não escrevêssemos todas as nossas histórias e estórias? Não há dúvida, a melhor escrita é o distante anonimato!  

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