Ainda na esquina, já
ouvia os latidos do cachorro. Certamente já havia sentido o seu cheiro e,
ansioso, esperava pela sua chegada. Fazia quase um ano que estava fora,
trabalhando em São Paulo, para poder manter a família. Todo mês enviava parte
do salário à mulher, que sempre ligava reclamando das contas, dizendo que
mandasse dinheiro, que desse um jeito, que já estava para não aguentar.
Durante todo o tempo
tinha sentido saudade dos filhos e da esposa, e ligava todos os finais de
semana, só para ouvir as suas vozes. O menino pedia um carrinho de brinquedo,
igual ao que o coleguinha tinha ganhado de aniversário; a menina pedia uma
boneca da Barbie, daquelas que vêm com um monte de acessórios; a esposa não
falava de saudades, apenas pedia que mandasse algum para as contas.
O cachorro já quase
derrubava o portão; latia e pulava, abanando o rabo feito louco. Parou no bar,
cumprimentou o vizinho e pediu uma pinga. Perguntou pelas novas, quis saber
sobre a esposa e os filhos, sem que ouvisse qualquer resposta. Depois, pediu
mais uma, que era para criar coragem. Falou sobre o tempo, parecia que ia chover.
O vizinho dizia amém; fazia tempo que não chovia e, se viesse, seria uma
bênção.
O portão estava
taramelado. Enfiou a mão por cima do muro e abriu. Talvez os filhos estivessem
na escola. Havia avisado que chegaria na sexta, mas, com certeza, a mulher
havia esquecido. O cachorro não sabia o que fazer, pulava, corria e latia,
sempre abanando o rabo. Colocou a bolsa no chão e o adulou. Depois mandou que
fosse deitar e parasse de tanto assanhamento.
As portas estavam
trancadas. A da sala tinha a vidraça coberta por uma cortina vermelha, enquanto
a da cozinha havia ganhado uma fechadura nova. Fazia tempo que a esposa
reclamava e pedia um dinheiro a mais para arrumar, pois a cidade estava crescendo
e os ladrões estavam cada dia mais sem vergonha. Estava com a chave da sala no
bolso, mas preferiu chamar pela mulher.
Durante um tempo
passeou pelo quintal, esperando por alguém. Lá dentro, um silêncio terrível. Por
um instante pensou ouvir grunhidos, mas, depois tudo se aquietou novamente.
Seria a esposa, os filhos, ou haveria mais alguém lá dentro?! Podia ser só a
sua mente pensando besteiras, afinal, sempre fora meio desconfiado, até mesmo
onde não tinha nada sempre imaginava haver alguma coisa. E se estivessem
preparando uma surpresa? Talvez estivessem todos em silêncio, ansiosos,
esperando que entrasse. Resoluto, abriu a porta e entrou.
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