Às vezes, parênteses são necessários para que tudo possa ser colocado em seu devido lugar. Eis, portanto, algumas explicações...
Da primeira vez, vim à São João da Lagoa, como dissera no "Juca Pessoa", contratado pela prefeitura para escrever sobre a história local. Do livro não obtive notícias, nem uma noite de autógrafos, nem um exemplar para os meus guardados. Mas disso não faço questão, pois cumpri a tarefa que me foi dada e recebi o combinado pela sua confecção.
Desta vez, vim por conta própria. Aproveitando-me das minhas férias, depois de um longo tempo vagando pelos salões dos palácios belorizontinos. Há tempos não escrevo um livro, nem faço qualquer reportagem; acomodei-me no gabinete de um deputado, de onde tiro o meu sustento e guardo algum para a velhice, que já me bate à porta. Mas o espírito de jornalista ainda me causa arrepios e a história do Arnaldo, faz tempo, me perturba as noites de sono.
Muito do que tenho escrito até aqui não passa de fruto da minha imaginação, e disso não me orgulho em dizer. De fato, não conheci o Arnaldo, o Reis ou a Candinha e o pouco que sei de cada um são recontos de bocas alheias, alguns poucos lagoanos ( ou seriam lagoenses?), que se dizem crianças àquela época, ou que ouviram de outras bocas as histórias que falam.
É verdade que São João da Lagoa, assim como as tantas pequenas cidades norte-mineiras, é um prato cheio para aqueles que gostam de boas histórias, recheadas de poesias e encantamentos. E assim foi com o Arnaldo. Talvez eu a tenha escutado enquanto tomava uma cerveja à beira da lagoa ou nas pesquisas que fizera sobre o Juca. Pode ser que ambos tenham sido contemporâneos, embora nenhuma ligação eu tenha encontrado entre eles.
Pelo que me consta, nenhum dos personagens até aqui descritos deixara qualquer herdeiro. Desta feita, tem-se brutalmente o fim das linhagens, o fim de todas as histórias. As fazendas já não existem, embora seja possível encontrar, através do GPS e alguma pesquisa, os locais exatos de cada uma, mas já não existem as velhas casas ou coisas que remontem aos velhos tempos. O que há são pequenos sítios, com homens e mulheres simples que nada sabem do passado.
O paradeiro de Arnaldo, de Reis e Candinha não é possível precisar. Até aqui, chegamos ao instante em que, possivelmente, tenham matado o primeiro, conforme se poderá constatar nos escritos supostamente deixados pelo doutor. Em tempo, reafirmo a imprecisão em se afirmar a veracidade dos escritos, uma vez que os recebi de um senhor de jeito simples e fala mansa, que disse tê-los recebidos do pai, que dissera ter achado numa noite chuvosa, quando voltava de uma viagem que fizera ao Pitão, para onde levara um rebanho. O cansaço já lhe pesava as pálpebras e doía-lhe o corpo, por isso, embora não estivesse tão longe do Pitinha, resolvera passar a noite na velha fazenda. Tudo já era uma tapera, mas as coisas ainda estavam todas intactas dentro da casa.
O homem teria arrebentado a porta e invadido o casarão. Sabia da história do doutor e por diversas vezes já tinha ouvido dizer que os fantasmas tomavam conta das coisas do homem, que , diziam, também já teria falecido; mas o cansaço era maior que o medo e, por isso, tinha resolvido dormir por ali. Descansara por toda a noite e, antes de partir, pegou tudo o que via de valor e aguentava carregar. Tempos depois, venderia tudo para um homem que passara pela cidade, mas esquecera-se do calhamaço, que o filho, agora, deixava guardado numa gaveta no meio da sala.
Do paradeiro de Candinha, muito pouco se sabe. Alguns afirmam que ela endoidecera e saira andando pelo mundo, tendo sido vista pela última vez pelos lados de Salinas; outros dizem que ela fugiu para a beira do Velho Chico, tendo se jogado, finalmente, no aconchego eterno dos seus braços. Assim, ficam o dito pelo não dito e passemos logo aos escritos do Doutor Reis.
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