quarta-feira, 16 de abril de 2014

AS LAVANDERIAS

Quando falaram que aquele deputado tinha uma lavanderia, logo pensei naqueles locais onde se lavam as roupas. Só depois é que me falaram que se tratava de lavagem de dinheiro. E o mais incrível de tudo é que quase todos os deputados, senadores, governadores e presidentes – sem falar dos prefeitos e vereadores – possuem suas lavanderias. Assim, talvez, nenhum deles possua dinheiro sujo. Ou não?!

A vida política é muito complicada. Quando eu era telespectador assíduo das TVs Câmara e Senado, gostava de ouvir as palavras do Demóstenes, do DEM, que, com sua voz mansa e equilibrada, demonstrava um grande caráter e seriedade imensurável. Só depois fui ligar o nome à figura diabólica. Talvez não tenha nenhuma ligação, mas, Demóstenes quase rima com demônio.

Quando estive em Brasília, em finais de 2011, tudo me pareceu falso por lá. Não o povo, gente trabalhadeira, a grande maioria oriundas de outros estados, principalmente da região nordeste do país. Falo dos políticos, com seus jeitos serenos e olhar de lince. Acho que por isso, quando fui à Câmara Federal, e por lá perambulei por algum tempo, não me senti bem. Tinha algo de sujo no ar.

Acho que as lavanderias são uma boa idéia. Mas não se deveriam lavar dinheiro. Dever-se-ia era lavar a cabeça de cada corrupto que por lá perambula. E não me venham com a ideia de que os brasilienses sejam todos corruptos. Vide: a maioria dos deputados é oriunda de outros estados. Como dizem alguns candangos: “A corrupção não é só de Brasília, muito dela chega dentro dos aviões que pousam no JK”.


De fato, a única lavanderia que conheci era a do Buriti; bem lá em cima, já perto do São Crispim. E lá não se lava dinheiro. Eu era ainda criança e via as mulheres com a barriga escorada nos tanques, batendo roupas, escovando, passando água e cantando. Outras, que não tinham o dinheiro nem o ingresso ao recinto, iam até a barragem do Renovação e, enquanto cantavam ou contavam causos, batiam as roupas na pedra, como se espancassem essa vida maldita, e corrupta.

segunda-feira, 14 de abril de 2014

SAUDADE

Quanta saudade me cabe no peito
Quanta dor me consome a alma
Enquanto o carro anda
Enquanto a vida passa
Enquanto o amor morre
Lentamente nos lábios.

É noite em minha vida
E o amor, puro e livre,
É apenas uma lembrança
Bela e distante
Feito a lua cheia
A mirar-me lá do céu.

DESILUSÕES

Na solidão do carro
Na escuridão da noite
Na ilusão da Vida

Em todos os momentos
A poesia se constrói
Se destrói e se refaz.

E na desilusão dos sonhos
Placidamente
Uma lágrima me estremece.

quinta-feira, 10 de abril de 2014

NOSSA BAGUNÇA ORGANIZADA

A tampinha de algum vidro de perfume está depositada sobre os livros na escrivaninha. Na verdade, não sei bem ao certo qual a serventia de uma tampinha, seja ela de vidros de perfume ou qualquer outra coisa. Assim como também não sei, ao certo, o porquê de tantos outros objetos. Também não sei o porquê de a tampinha ainda estar sobre a escrivaninha. E concluo que, de fato, não sabemos de quase nada.

É estranho, mas, acostumamo-nos a guardar um monte de coisa, ainda que estas não nos sirvam para nada, afinal, dizem que o que não presta deve ser guardado por sete anos. Eu, por exemplo, tenho sobre esta mesma escrivaninha uma capa velha de um celular antigo que nem possuo mais; um pedaço de giz branco, já bastante gasto; um relógio sem pilha ou bateria, logo, sem qualquer utilidade e uma porca de metal, retirada de alguma coisa velha, que nem mesmo sei para que serve!

E todo mundo tem as suas tranqueiras; alguns, bem guardados, outros, como eu, deixam-nas espalhadas pela casa, ao bel-sabor do tempo – e do vento. Lembro-me, pois, daquele sujeito que tinha um quarto apenas para guardar suas tralhas. Chegava e jogava tudo o que não lhe servia mais dentro daquele cômodo. Um dia, num átimo de limpeza e organização, sua esposa deu de arrumar toda aquela bagunça. Ao entrar no quartinho da bagunça, o homem não se achou naquele espaço e ficou perdido em meio a tamanha organização.


É desse jeito, cada um temos a nossa própria bagunça organizada e sabemos muito bem onde não colocamos o que não precisamos. E tudo aquilo continuará no mesmo lugar, na mesma desorganização premeditada, até o dia em que alguma alma desvirtuada, nossas namoradas, num momento de loucura, cismará de dar uma faxina geral. Daí já não nos encontraremos mais e, acredite, teremos alguns sete anos de muito azar, e perdição!

quarta-feira, 9 de abril de 2014

PROFESSOR MORRE NO PARAÍSO

Em São Paulo tem um bairro que se chama paraíso. Nunca fui à capital paulista; sendo assim, nunca fui ao Paraíso. Boa parte dos corjesuenses, creio eu, também não conhece o Paraíso, em São Paulo. Como bons mineiros, preferimos ficar quietos no nosso canto, olhando o tempo passar, silenciosos e pensativos, sem grandes alardes. Mas não é este o X da questão. O que me intriga é que um professor morreu no Paraíso.

Deu no jornal, na minha televisão, em plena manhã de quarta-feira: “professor é morto dentro de carro, enquanto esperava pela esposa, no estacionamento de um supermercado, no paraíso, em São Paulo. O homem falava ao telefone”. É incrível, mas, era um professor no paraíso, dentro de um carro, falando ao telefone, mas, ainda assim, foi morto por bandidos. O mundo está mesmo perdido.

Aqui de Minas, bem no norte do estado, numa cidadezinha besta de nome abençoado: Coração de Jesus, fico imaginando a cena: O homem acabara de passar no banco para pegar o seu parco salário, fruto de um mês inteiro de sofrimento e estresse dentro da sala de aula, cada turma com quase quarenta alunos; a maioria desinteressados e sem perspectivas. Dinheiro suado, que mal daria para pagar as contas do mês.

A primeira coisa a se fazer seria pagar as contas de luz, água e o aluguel; depois, pagar-se-iam as contas que levam o nome ao SPC e, por último, fazer a feira do mês e pagar as contas menores. E ele já estava na penúltima etapa do roteiro, já quase sem dinheiro, cansado de tanta correria, louco para chegar em casa, tomar um banho e cair na cama.


A mulher se demorava lá dentro. Talvez estivesse comprando doces, salgadinhos, bobagens. Já lhe havia avisado que comprasse apenas o necessário; o dinheiro estava parco e as contas ainda iam a galope. Resolveu ligar para a esposa, pedir que se apressasse, que fossem embora; de manhã teria mais cinco horários para lecionar. De repente, um bate na janela. Afastou o telefone e virou-se. No susto, um grito, um movimento involuntário e o tiro. Não haveria aula na manhã seguinte; o professor fora ao paraíso.

terça-feira, 8 de abril de 2014

A PROMESSA

Quando o primeiro tiro falhou, ele pensou em correr, procurar abrigo, gritar por socorro; mas faltaram-lhe as pernas e a única ação que conseguiu foi ajoelhar-se e orar. Nunca fora um homem de fé, mas, naquela situação, lembrara-se de que talvez aquela fosse a sua última saída. Esperava que a arma mascasse, que o tiro não saísse, que o coração do garoto se abrandasse.

Era um garoto quem empunhava o 38. No máximo, teria uns alguns 17 anos, ainda com o rosto coberto de espinhas, o cabelo cortado à Moicano e aparelhos nos dentes. Não tinha cara de criminoso. Contrariando as expectativas, vestia roupas de marca e trazia alguns cordões de ouro no braço e no pescoço. Talvez nem fosse pobre ou favelado.

As orações pareciam surtir efeito. O garoto tentou mais um disparo, mas a arma falhou. Alguns palavrões foram ouvidos, enquanto ele continuava a sua procissão de fé. Tentava se lembrar das orações que a mãe fazia todas as noites, quando iam dormir. Fazia tempo que não orava, que não ia à uma igreja, que não pediam as bênçãos de Deus. Mas, agora, rezava, com toda a fé que nunca antes tivera.

O rapazinho irritava-se com o seu revólver. Mexia-o de um lado a outro, olhava pelos buracos do tambor; tirava as balas e punha-as novamente na arma, puxava o gatilho e nada. Não tinha jeito, melhor era deixar aquele homem ali e fugir. Já tinha o que queria, o que ganhara já seria o suficiente para uma boa pedra ou alguns cigarros. Mas e se ele o entregasse, tinha que dar um fim no sujeito e a droga da arma que não funcionava!


          O suor já lhe corria pela testa; os olhos fechados, à espera do disparo final, enquanto as orações aumentavam a sua esperança. Pela última, vez escutara um movimento. O garoto, de novo, mexia no revólver, empunhava-o à altura dos olhos e atirava. Não sentira nada, nenhuma dor ou impacto. A arma falhara novamente, enquanto, ele fazia a sua última tentativa, uma promessa a todos os santos: casaria com Tereza – depois de 10 anos de namoro – se lhe poupassem a vida. Agora teria que cumprir a sua triste promessa.

segunda-feira, 7 de abril de 2014

INSTANTE

Matutamos por muito tempo
Labutamos por toda a noite
Briquitamos por toda a vida
E morremos por um instante.

Restaram-nos as dores
Sobraram-nos o silêncio
E a falsa ilusão moral
de que nada persistira.

Eis que nos jogamos
Digladiamos solitários
E perecemos sozinhos

Como se a poesia inerte
E os sorrisos sarcásticos
Fossem apenas o nosso fim.

DESEJO

Quero numa manhã de sol
Morrer poeta
Em silêncio
Sem palavras ou suspiros

Morrer apenas
Como morrem os pássaros
Como morrem as flores
Como canta a poesia

E essa será uma manhã feliz
Posto que não haverá dor
Nem lágrimas

Restará apenas um sorriso
Tímido e placido
Brotando dos olhos do meu amor.