A vida parou de repente. Sem sobressaltos ela abriu a porta e desceu. Não sabaia aonde ir, o que fazer, como agir. Ajeitou os cabelos, melhorou o sorriso e, antes de ir para sempre, resolveu revisitar os seus. Chegou de mansinho, sentou-se junto à mesa e pôs-se a saborear alguns pães de queijo que estavam sobre a mesa; tomou do café quentinho, adoçado com a rapadura que o pai fazia e conversou as velhas conversas de sempre.
Falaram dos irmãos, dos tios, dos seus filhos, dos netos que iria ter. A mãe assentada sobre o fogão à lenha sujava um naco de fumo nas cinzas e punhas-se a passá-lo nos dentes; o pai, do outro lado da mesa, preparava um grosso cigarro de palha. O irmãos mais velho acabara de chegar da rua; disse que fazia um ventinho pelas bandas de baixo e, com certeza, haveria de chuver mais tarde. No curral, as vacas mugiam e o pai lembrava-se de que teria que tirar o leite de madrugada, mas que se chovesse aquilo ficaria uma balbúrdia, porque vaca é que nem a gente, naaão aguenta ver coisa diferente que se assanha.
Fazia tempos que naão chovia. O gado estava magro; a mãe disse que duas reses jaá haviam morrido e que o córrego já estava por secar. O irmão lembrou-se da cadelinha Pitucha. Coitadinha! Ficara por ali, com sede, com fome, correndo atrás de tatu, veado, preá; até que a cegueira lhe viesse;entaão, pegou o seu caminho e foi morrer ao longe, no meio do mato.
A conversa se prolongava. Ela sentia a tristeza lhe aumentando no peito. Sentia vontade de chorar; abraçar o pai, beijar a mãe, acariciar os cabelos bastante negros do irmão. Não; não o faria. Nunca o haviam feito. A família era assim, seca, bruta, mas cheia de amor. Isso se via nas conversas, nas brigas, no alimento que entrava todo dia em casa. Levantou-se devagarinho; deixou os seus a conversarem, abriu a porta e foi caminhando, caminhando, até que sumisse na escuridão.