Quase sempre vou a Coração
de Jesus, permanecendo algumas horas, a fim de resolver alguns pequenos
problemas, pagar algumas contas e rever os parentes. Mas, eis que numa dessas,
dentro do banco, um sujeito começou a me encarar. Firmei as vistas na tentativa
de reconhecê-lo, mas, como não tivesse êxito, resolvi despistar.
Peguei o celular e, como
quem se aviasse de algo sério, comecei a cutucar a agenda, rever algumas fotos,
brincar com as teclas já gastas do telefone. Tarefa inútil. Uma mão firme tocou
o meu ombro e, ao atentar-me, ele já me apertava a mão com um sorriso
escancarado:
- Há quanto tempo, meu
amigo! Pensei que não o veria mais, mas quem é vivo sempre aparece. Não é
verdade?!
Tentei buscar pela memória,
procurando no seu rosto sorridente, algo que ligasse a pessoa a algum nome.
Inútil. Não havia jeito de me recordar. Talvez fosse algum amigo de infância,
um colega de farra, algum ex-aluno. Não tinha jeito.
Creio que ele não percebera
o meu embaraço e, antes que eu confabulasse qualquer resposta, continuou a
desfiar seu parlatório:
- Rapaz, como anda a
família, os meninos?... Lembro-me, como se fosse ontem, das nossas conversas, o
futebol, as noites de farra... Mas tudo isso são coisas passadas, né? Eu sei
como é. Eu também me casei, com a Andréia, lembra dela? Muito gente fina, a
Andréia. Meio doidinha, mas não posso me queixar...
De fato, lembrava-me de
várias Andréias: colegas, amigas, alunas. Talvez se referisse a algumas delas.
Ainda tentei intervir, mas, o meu interlocutor não se calava.
- Estamos planejando um
filho pra esse ano. E já vou lhe avisando, você vai ser o padrinho. Então, já
posso chamar de compadre! Isso é... Se você aceitar. Você e Catarina, Claro!
Não poderia deixar a Cata de fora. Aliás, como ela está? Fiquei sabendo que não
estava muito bem de saúde...
Eu já ia dizer que não era
eu o seu amigo. Afinal, não sou casado com alguma Cata e nem mesmo sei quem é
Catarina. Mal abri a boca, quando o televisorzinho à nossa frente chamou pelo
seu número. Abraçou-me rapidamente e despediu-se:
- Ficamos assim, então,
Ricardo: Conversa com a Cata e, depois, me responda. Ainda moro no mesmo lugar.
Depois que a Andréia resolveu ficar de vez, a casa anda mais arrumadinha, mas a
fachada ainda é a mesma. Abraço, amigão e vê se não desaparece!
Não deu tempo de me
despedir, e nem dizer que não sou o Ricardo. Ainda assim, obrigado pelo
convite.